Warning: Use of undefined constant CONCATENATE_SCRIPTS - assumed 'CONCATENATE_SCRIPTS' (this will throw an Error in a future version of PHP) in /home/finisgeekis/www/wp-config.php on line 98

Warning: Cannot modify header information - headers already sent by (output started at /home/finisgeekis/www/wp-config.php:98) in /home/finisgeekis/www/wp-includes/feed-rss2.php on line 8
Mari Okada – finisgeekis https://www.finisgeekis.com O universo geek para além do óbvio Wed, 22 Jul 2020 21:34:16 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.7.11 https://i2.wp.com/www.finisgeekis.com/wp-content/uploads/2019/02/cropped-logo_square.jpg?fit=32%2C32&ssl=1 Mari Okada – finisgeekis https://www.finisgeekis.com 32 32 139639372 “Olhos de Gato”: uma fábula carente de uma moral https://www.finisgeekis.com/2020/07/22/olhos-de-gato-uma-fabula-carente-de-uma-moral/ https://www.finisgeekis.com/2020/07/22/olhos-de-gato-uma-fabula-carente-de-uma-moral/#comments Wed, 22 Jul 2020 20:37:52 +0000 http://www.finisgeekis.com/?p=22313 AVISO: Contém SPOILERS para “Olhos de Gato”

Quando eu tinha 11 anos, meus colegas inventaram que uma menina da turma gostava de mim.

Não passava de crueldade infantil. Um pretexto para fazer piadas cada vez que nos flagravam juntos.

Eu e ela nos sentamos na cadeira vizinha do ônibus? Estão namorando! Trocaram uma palavra sobre a prova? É uma confissão de amor! Caíram no mesmo time na Educação Física? Vai rolar beijo!

Eu sabia, lá no fundo, que a culpa não era dela.  Ainda assim, apavorado como estava com os dedos apontados, reagi como todo pré-adolescente reagiria: fugindo.

Pelo tempo que durou a brincadeira eu passei a evitá-la.  Grudava em algum outro colega na excursão, apenas para não correr o risco de sentar de seu lado. Se ela falava comigo, eu virara a cara.

Nem por isso eu deixei de aprender – com o tempo, reconheço – que aquilo foi errado. Gosto de acreditar que meus ex-colegas, tantos os que provocaram quanto os que riram, chegaram na mesma conclusão.

Olhos de Gato, anime do Studio Colorido licenciado pela Netflix, traz uma cena que imita, praticamente à letra, o episódio desagradável da minha sexta série. Mesmo assim, nada em seu roteiro me faz acreditar que sua protagonista aprendeu o que deveria com a experiência.

Querendo chorar, finjo ser uma gata

Essa protagonista é Muge, uma garota que não tem a mais fácil das adolescências. Seus pais se divorciaram quando era pequena. Iletrada nos jogos do mundo adulto, ela interpretou o episódio como tentativa da mãe de abandoná-la.

Tudo muda quando Muge cruza caminhos com um gato falante com a pinta sinistra de um coadjuvante de Majora’s Mask. A criatura lhe oferece uma máscara capaz de transformá-la em uma gata. Ela aceita sem pestanejar. Qualquer coisa que a distraia de sua dor, por algumas horas que seja, só pode ser bem-vinda.

Dê um fast forward ao presente, e Muge parece ter tirado o melhor de sua barganha.  De dia, ela frequenta a escola como uma garota normal, babando ovo sobre Hinode, colega por quem se derrete. De noite, ela frequenta sua casa como gata, mendigando carinhos com que, na vida real, pode apenas sonhar.

O que pode dar errado?

Como Muge eventualmente descobre, bastante coisa. O título original do filme, Nakitai Watashi wa Neko wo Kaburu (“Querendo chorar, eu finjo ser uma gata”) dá uma ideia do que realmente está em jogo.

Acostumada a sumir com a ajuda de sua máscara mágica, Muge pouco faz para resolver os problemas de sua vida. Em casa, sua relação com a família piora a olhos vistos. Magoada pelo divórcio, ela desconta na madastra a raiva que sente pela mãe.

Na escola, seus flertes com Hinode se tornam cada vez mais inapropriados. Muge o cumprimenta com “bundadas”, arranja brigas em seu nome e o afoga com mimos, por mais que ele insista que não está interessado.

Na sua cabeça, Muge age “por amor”.  Porém, não é preciso muito para ver que tudo o que faz é chamar atenção para si mesma.

Como tantas outras jovens que sofrem em silêncio, Muge veste uma máscara sempre sorridente, sempre empolgada. Tomada como excêntrica, ela escapa de ter sua vida posta em uma lupa. Ninguém suspeita que o palhaço da turma seja justamente a pessoa que chora quando as luzes se apagam.

A situação chega ao seu limite quando um de seus flertes sai de controle. Um bilhetinho de amor cai nas mãos dos encrenqueiros da sala, e Hinode é humilhado em público. Tal como eu durante meus anos de escola, o garoto desconta a raiva em Muge.

Devastada, a adolescente se transformada em gata, desejando, no fundo, nunca mais voltar à forma humana. É neste momento que sua bênção se prova uma maldição, e ela descobre que sua máscara de gato veio com um preço terrível.

Como contos de fada nos ensinam, magia é movida por desejos, e aqueles que os realizam nem sempre têm nosso bem-estar em mente. Ao sentir vontade de largar a vida de garota, ela se transforma para sempre em gata. Tudo, descobre, segundo os planos do vendedor de máscara, que vive de oferecer fantasias a pessoas tristes para depois roubar sua humanidade.

Se deseja voltar a ser humana, Muge deverá não apenas enfrentá-lo, mas revisitar o desejo de chorar – como diz o título do anime – que a fez desejar ser uma gata.

Olhos de Gato foi produzido pelo Studio Colorido (de Penguin Highway e Typhoon no Noruda) e repete a cartilha que tornou a casa famosa: personagens adolescentes, um ressentimento do mundo jovem, uma intervenção sobrenatural que sai do controle, o retorno à normalidade após um importante ensinamento.

A fórmula está longe de ser nova. Pelo contrário, está por trás de clássicos da literatura infanto-juvenil como As Memórias de MarnieUma Dobra no Tempo, Ponte para Terabítia e Onde Vivem os Monstros.  A própria Mari Okada, que assina o roteiro, previamente deu vida ao formato com o excelente Kokosake.

É fácil entender seu apelo. O mundo adulto está cheio de coisas que, aos olhos de uma criança, parecem digna de um pesadelo. Infidelidade. Divórcio. Mortes de entes queridos. Violências explicítas, e outras tantas dissimuladas.

Kokosake

Nem sempre é fácil encarar tais barras de cabeça erguida, mesmo para um maior de idade.  Na ficção, como na vida, é com a fantasia que nos armamos para enfrentar nossos monstros interiores.

Esse, infelizmente, não é o caso de Olhos de Gato. Embora o filme nos convide a olhar para sua protagonista de outra forma, Muge em si não chega a aprender uma lição a altura do sofrimento que causa aos outros.

Ao longo do anime, ela fere os sentimentos da madastra, recusando seus gestos de carinho e colocando-se em perigo à toa. Machuca Yori, sua melhor amiga, que em dado momento chora, implorando para que não assedie mais o Hinode.

Acima de tudo, ela machuca o garoto, expondo-o ao tipo de humilhação que pré-adolescentes temem mais que a própria morte.

Essas atitudes colocam Muge em apuros, mas em nenhum momento ela parece entender que o que fez é errado. Pelo contrário, são justamente aqueles que mais levaram suas patadas que acabam crescendo como indivíduos.

“Ela fez aquilo por mim” diz Hinode de suas constantes provocações “É uma expressão de amor”.

“Muge sempre se faz de corajosa” explica Yori “Ela finge que está tudo bem mesmo quando está sofrendo.”

Numa pontada de ironia, o obrigatório monólogo de terceiro ato – quando o herói, diante da adversidade, conta aos espectadores por que está lutando– vem da boca não dela, mas de Hinode.

Não que Muge, também, não reconheça os próprios erros. “Eu fechei meu coração para todo mundo” ela diz ao fim, o mais próximo que o filme traz de um pedido de desculpas “Mas agora eu sei que estava errada. Tentarei me aproximar deles também.”

É um começo, mas dito na hora que é, após o ato heróico de Hinode, parece perder de vista o mais importante. Muge só é salva porque outras pessoas se puseram na linha para resgatá-la. Muito embora, a despeito das insistências do roteiro, ela pouco tenha feito por merecer.

O resultado é um clímax confuso e até moralmente questionável, que parece sugerir que não precisamos mover um dedo para melhorar. Afinal, as pessoas que nos amam estão aí para fazer o trabalho duro.

Um tampão emocional

Parte do problema é que Olhos de Gato parece não saber qual história deseja contar.

Dois são os conflitos que levam Muge a viver como gata: o amor não correspondido pelo coleguinha da escola e o trauma de ter sido abandonada pela mãe.

O primeiro é uma experiência desagradável, mas é o tipo de coisa pela qual todos passam. O segundo é um trauma catastrófico, capaz de abrir feridas que levam muitos anos a sarar – quando não uma vida inteira.

O primeiro pede um romance escolar. O segundo, uma história capaz de lidar, sem condescendência, com um dos piores momentos na vida de uma criança.

Há muita dor envolvida na perda de uma mãe. Dor da criança ao se ver abandonada. Dor dirigida, injustamente, ao padastro ou à madastra, como se eles fossem os culpados por ter lhes arrancado da família. Dor dos guardiões, que não sabem o que fazer para acolher uma pré-adolescente que se recusa a ser amada.

Olhos de Gato nos deixa claro que foi essa dor que levou Muge a obcecar com Hinode.

“Eu estava cansada desse mundo” ela conta, “mas agora sei que não é tão ruim, porque eu conheci o Hinode”.

O garoto, para ela, não é uma pessoa de verdade, mas um mero tampão emocional. Um namorado de mentira a quem dedica o afeto que deveria, mas não consegue, dar à madrasta.

“É isso!” ela diz após trocar farpas com a família “Vou me casar com Hinode e sair dessa casa o quanto antes”.

Em uma história mais honesta, Muge entenderia que se esconder atrás de uma máscara, seja ela literal (a de gato) ou metafórica (o crush por Hinode) não vai preencher o verdadeiro buraco em seu coração.

Infelizmente, alguém no Studio Colorido deve ter avisado Mari Okada de que histórias de amor vendem mais. O filme insiste em tratar sua relação como um romance, por mais que Muge e Hinode não tenham nada remotamente parecido com química.

A relação dos dois é tão forçada que o garoto começa sua confissão admitindo que não a conhece.

O tempo de pedir desculpas

Em As Memórias de Marnie filme do Studio Ghibli, a adolescente Anna reage ao medo de não ser amada pela mãe adotiva fechando-se aos outros. Como a Muge de Olhos de Gato, ela aprende a encarar a guardiã de outra forma após conhecer uma figura muito especial.

Mas Anna, ao contrário de Muge, não depende de uma declaração de amor para se validar. Quando a mãe adotiva aparece para salvá-la, ela dispensa as explicações. Sua lição ela aprendeu sozinha, por meio das grosserias que distribuiu, das dúvidas que sofreu e das lágrimas que derramou ao longo do filme.

Anna entende isso, e é por isto que arruma tempo para pedir desculpas – pessoalmente – àqueles que machucou.

Muge, pelo contrário, termina sua história de mãos dadas com Hinode. Da reconciliação com sua família, temos apenas um slide de créditos, em que a garota e sua madrasta mal trocam palavras.

Olhos de Gato troca sinceridade por satisfação barata, a chance de passar uma mensagem pelo mais genérico “viveram-felizes-para-sempre”.

Sua viagem ao mundo dos gatos é recheada de efeitos visuais, mas carente daquilo que é mais importante em uma história fantástica: a capacidades de ensinar verdades sobre o mundo do lado de cá.

]]>
https://www.finisgeekis.com/2020/07/22/olhos-de-gato-uma-fabula-carente-de-uma-moral/feed/ 1 22313
“Maquia”: o cinema Okada levado ao seu limite https://www.finisgeekis.com/2018/11/19/maquia-o-cinema-okada-levado-ao-seu-limite/ https://www.finisgeekis.com/2018/11/19/maquia-o-cinema-okada-levado-ao-seu-limite/#comments Mon, 19 Nov 2018 21:25:22 +0000 http://www.finisgeekis.com/?p=20675 Alguns filmes nos dizem tudo o precisamos só de olhar suas fichas.

P.A. Works é um estúdio conhecido pelos seus visuais deslumbrantes. Kenji Kawai, por suas trilhas sonoras comoventes. Mari Okada, pelos roteiros mais chorosos do mundo dos animes. Ao combinar os três em um mesmo projeto, sabemos exatamente o que nos aguarda: um filme grande, farto, capaz de fazer o marmanjão mais sisudo se afogar em lágrimas.

A parceria tem nome e sobrenome: Sayonara no Asa ni Yokusoku no Hana wo Sazarou, ou Maquia: When the Promised Flower Blooms. Estreia de Okada como diretora, o longa oferece isso e muito mais.

O enredo

A história acompanha as desventuras de Maquia, membro de um povo conhecido como Iorph.  Sua raça tem a aparência de adolescentes loiros e vive de tecer mantas cujas tramas podem ser “lidas” como um escrito. Eles também são imortais.

Iorph vivem isolados, pois sua longevidade proíbe relações normais. “Você não deve amar ninguém” uma anciã diz a Maquia. “A partir do momento em que amar alguém você estará de fato sozinha”.

A solidão de Maquia, porém, está apenas começando. Interessado em gerar uma linhagem que, como os Iorph, viva para sempre, o líder do reino de Mezarte decide sequestrar uma noiva da tribo e forçá-la a se casar com seu herdeiro.

Maquia sobrevive ao ataque, mas se vê jogada de cabeça em um país dilacerado pela guerra. Suas andanças a levam ao encontro de um bebê cuja mãe foi assassinada por soldados. Contra seu melhor julgamento, a garota decide adotá-lo.

A história de uma mãe arrastando sua criança por um campo de batalha é uma das imagens clássicas da literatura de guerra. Bônus se a criança for adotiva: uma metáfora poderosa (e esperançosa) de que um povo dilacerado é capaz de se reatar. Não é à toa que Kono Sekai no Katasumi Ni , conto sobre a tragédia de Hiroshima, escolheu esta mesmíssima imagem para encerrar sua narrativa.

Maquia poderia se tornar outra versão desse mote, não fosse pela imortalidade de sua protagonista. Como Iorph, Maquia está condenada a viver para sempre nas peles de uma adolescente. Já seu filho, Ariel, está fadado a crescer, envelhecer – e, inevitavelmente, morrer nos seus braços.

Mommy issues

Mari Okada ganhou fama como a rainha indisputável do melodrama. Pela força bruta de seus temas,Maquia é o trabalho mais ambicioso, sensível e visceral que já veio de sua pena.

Que o abismo entre Maquia e Ariel seja uma tragédia não anunciada não reduz em nada o poder de sua execução. O desenvolvimento nos chega aos poucos, uma morte por mil pequenos cortes.

A imortalidade força Maquia a uma vida itinerante. Para não atrair suspeitas, mãe e filho circulam de cidade a cidade, tendo apenas a companhia um do outro.

Ariel, porém, deseja separar-se. É possível culpá-lo? Um adolescente não deveria ter de dividir a cama com uma garota da sua idade. Talvez ele deseje criar raízes, fazer amigos. Viver uma vida que tenha sentido. Senão isso, uma vida que ao menos que pertença a ele, defeitos e tudo.

Em uma cena, Ariel é forçado a beber além da conta por seus colegas de trabalho. Ele retorna a casa embriagado, vacilante de enjoo, medo e culpa. O reencontro com a mãe não termina bem. Ariel precisa de uma figura de autoridade. Um porto seguro. Eternamente em fuga, fisicamente presa na juventude, Maquia é incapaz de oferecer qualquer um dos dois.

Okada teve uma relação tempestuosa com sua própria mãe, e é tentador ver na protagonista um desabafo pessoal. Uma mãe infantilizada, despreparada para os desafios do mundo adulto, cujo filho, a despeito de seus esforços, a trata apenas como uma igual.

Quantos jovens pais mundo afora enfrentaram barras parecidas? São momentos de honestidade como esse que fazem Maquia brilhar.

Uma guerra vista de baixo

É difícil apontar o que corta mais fundo: seus conflitos familiares ou o terror sempre presente da guerra. Para Maquia, Okada pincela um mundo fantástico gigantesco, mas não parece interessada em colorir os detalhes. Seu cenário fantástico é um pano de fundo mais que um catalisador de seu enredo.

De fato, sua trama chega a ser confusa e inconstante, narrada em arcos fechados que parecem existir à revelia um do outro. Fãs de aventura fantástica talvez percam a paciência com esse descaso. Mas esse não é um filme para eles.

Muito da fantasia se perde em nomes próprios. Atenção demais é gasta identificando facções em guerra, enumerando baixas e descrevendo estratégias, quando os próprios conflitos do nosso tempo mostram que essas coisas pouco importam.

Maquia destila esses conflitos ao seu valor humano, em um retrato visto de baixo. Contado com uma sensibilidade honesta, dolorosamente feminina.

Considere Leilia, amiga de Maquia forçada a gerar um herdeiro para o príncipe. Leilia dá à luz uma garota. O palácio não está impressionado. Meninas não têm valor; apenas um filho homem pode levar o reino à frente.

O parto, contudo, leva a beleza do seu corpo. Em dada cena, nós a vemos atormentada, coberta de penduricalhos. Seu marido perdeu o interesse sexual por ela, e o palácio tenta várias simpatias para que consiga procriar. “Façam alguma coisa” grita o rei. “Pelo menos deem a ele outra mulher!”

Leilia foi sequestrada, estuprada e confinada em uma torre como chocadeira. Mas seu desespero vai além: ao ser rejeitada, ela perde até a capacidade de se resignar. Não basta privá-la da sua liberdade ou dignidade. A guerra precisou tirar qualquer sentido da sua vida.

Ou então considere Dita, que também dá à luz uma criança no curso do longa. As dores de seu parto são intercaladas a uma cena de batalha, de que seu marido participa. Os dois combatem pela própria vida, e não sabemos dizer qual das lutas é mais acirrada.

Na verdade, sabemos sim. É evidente que o choque de espadas e o trovejar de canhões é apenas um pano de fundo para o verdadeiro duelo.

Homens gostam de pensar que a história é escrita com o cano de uma arma. Okada nos lembra, como fizeram outras escritoras, que para cada guerreiro em marcha há uma mulher reunindo os cacos que a violência dispersou.

A tomada funciona graças à produção da P.A. Works, um trabalho prodigioso mesmo para os padrões do estúdio. De fato, Maquia é um filme grande, que está em seu elemento em tomadas ambiciosas, cenários detalhados e uma das melhores trilhas da carreira de Kenji Kawai.

Embora o filme nunca supere a beleza das tomadas de abertura, sua fotografia e ambientação nunca deixam a desejar. No país de Mezarte, vielas mediterrâneas dividem espaço com catedrais góticas, fornaças industriais e tavernas abarrotadas. Poucos são os animes que oferecem um retrato tão vibrante de uma cidade em movimento.

“100% Okada”

É uma pena, porém, que Maquia se deixe levar pela própria grandiloquência.

Como roteirista, Okada carrega nas tintas nos momentos mais inoportunos, cometendo exageros que beiram a manipulação. A cena de Maquia libertando Ariel de um cadáver em rigor mortis é a mais apelativa que já vi em qualquer um de seus animes. O funeral choroso de um cachorro chega a ser ridículo.

Melodramas são uma corda bamba, e Okada sempre deixou o excesso de lágrimas derrubá-la para um dos lados. Foi assim no final histérico de Ano Hana ou no último terço de Hisone to Masotan, incomparavelmente mais fraco que seu início.

Mesmo comparado a ele, no entanto, Maquia parece um retrocesso. Apesar de sua sensibilidade transbordante, Okada escreve (e dirige) como se nos guiasse pela mão, dizendo exatamente o que devemos sentir.

A coisa passa dos limites nas cenas finais, quando o clímax é intercalado com flashbacks de cenas chorosas de outros momentos do longa.  É um recurso batido, desnecessário e condescendente, que me leva a pensar se esse filme “100% Okada” não teria a ganhar com um diretor mais experiente.

Sem colegas para barrar seus excessos, Okada entrega um filme que parece uma obra de estreia: ambicioso e apaixonado, mas também patético, repetitivo e desconjuntado.

Dizem que escritores param de ser editados quando ficam famosos. Maquia é a prova de que isso nem sempre é bom. Artistas adoram reclamar de que sofrem interferência. A verdade, porém, é que boas obras devem tanto à tesoura quanto à caneta.

]]>
https://www.finisgeekis.com/2018/11/19/maquia-o-cinema-okada-levado-ao-seu-limite/feed/ 1 20675