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{"id":23062,"date":"2021-12-08T19:38:46","date_gmt":"2021-12-08T22:38:46","guid":{"rendered":"http:\/\/www.finisgeekis.com\/?p=23062"},"modified":"2021-12-08T19:38:48","modified_gmt":"2021-12-08T22:38:48","slug":"heike-monogatari-e-a-devassidao","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/2021\/12\/08\/heike-monogatari-e-a-devassidao\/","title":{"rendered":"“Heike Monogatari” e a devassid\u00e3o"},"content":{"rendered":"\n

\u00c9 normal que cidad\u00e3os falem mal de seus pol\u00edticos.<\/p>\n\n\n\n

Viver em sociedade \u00e9 uma coisa naturalmente estressante. N\u00e3o escolhemos em que pa\u00eds, ou sob que tipo de governo, temos o infort\u00fanio de nascer. Ningu\u00e9m nos pergunta se queremos ou n\u00e3o obedecer \u00e0s leis. E aqueles que est\u00e3o no poder t\u00eam uma capacidade sem igual de tornar nossa vida um inferno, sem que, na maioria das vezes, possamos fazer qualquer coisa para evitar.<\/p>\n\n\n\n

A onda de populismos de extrema-direita que sacudiu o mundo na \u00faltima d\u00e9cada deu um novo sentido a essa insatisfa\u00e7\u00e3o. Os l\u00edderes que subiram ao poder n\u00e3o s\u00e3o apenas corruptos ou incompetentes. S\u00e3o seres humanos repugnantes em praticamente todos os sentidos imagin\u00e1veis, que parecem se esfor\u00e7ar para violar cada limite da dec\u00eancia e bom gosto.<\/p>\n\n\n\n

Para aqueles que acompanham os notici\u00e1rios, a impress\u00e3o \u00e9 de que n\u00e3o somos mais apenas passageiros em uma viagem que embarcamos a contragosto (o que j\u00e1 seria, por si s\u00f3, ruim). Estamos acorrentados a um ve\u00edculo que segue desgovernado \u00e0 beira de um precip\u00edcio. \u00a0<\/p>\n\n\n\n

Se existe algum alento, \u00e9 o de que n\u00e3o somos os primeiros a vivenciar tempos turbulentos \u2013 nem a transformar estas turbul\u00eancias em arte. Heike Monogatari, <\/em>\u00e9pico da literatura japonesa recentemente adaptado \u00e0s telas, \u00e9 uma verdadeira li\u00e7\u00e3o do que torna um governo leg\u00edtimo \u2013 e das \u00e1guas profundas que nos esperam se nossos l\u00edderes flertarem com o abismo.<\/p>\n\n\n\n\n\n\n\n

Tirania e devassid\u00e3o<\/strong><\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

Se voc\u00ea n\u00e3o conhece a obra, aqui vai um primer.<\/em><\/p>\n\n\n\n

Heike Monogatari <\/em>\u00e9 um \u00e9pico sobre a derrocada dos Heike (tamb\u00e9m conhecidos como Taira), cl\u00e3 que dominou a pol\u00edtica japonesa no final do s\u00e9culo XII. Poderosos e bem conectados, os Heike deixam o sucesso subir \u00e0 cabe\u00e7a e se rendem a atrocidades de toda esp\u00e9cie. Seus desmandos motivam um cl\u00e3 rival, os Genji, a usurp\u00e1-los do poder.<\/p>\n\n\n\n

O conflito, baseado em eventos reais, \u00e9 conhecido como a Guerra Genpei<\/a> e terminou com a vit\u00f3ria dos Genji.<\/p>\n\n\n\n

Sua adapta\u00e7\u00e3o em anime, produzida pelo est\u00fadio Science Saru e dirigida por Naoko Yamada, condensa em apenas 11 epis\u00f3dios as mais de 700 p\u00e1ginas do texto original (a depender da edi\u00e7\u00e3o). Mesmo assim, ela preserva a li\u00e7\u00e3o central da obra sobre a natureza e consequ\u00eancias do poder.<\/p>\n\n\n\n

Lendo (ou assistindo) Heike Monogatari <\/em>\u00e0 luz dos populismos contempor\u00e2neos, poucas personagens nos despertam mais familiaridade que Kiso no Yoshinaka, o terr\u00edvel comandante dos Genji que toma Kyoto das m\u00e3os dos Heike. Bruto criado no anterior, a pompa e a etiqueta da capital imperial s\u00e3o t\u00e3o incompreens\u00edveis quanto uma l\u00edngua estrangeira. Pior, Kiso parece tirar prazer em escandalizar seus pares \u2013 e mesmo seus superiores \u2013 quebrando o maior n\u00famero de regras poss\u00edvel.<\/p>\n\n\n\n

Como os populistas de hoje, ele se gaba de ser um outsider<\/em>, vestindo a intransig\u00eancia com o establishment <\/em>e o desprezo \u00e0s regras do jogo como um manto de que se orgulhar.<\/p>\n\n\n\n

Infelizmente para as personagens do \u00e9pico, se os outsiders <\/em>de hoje fingem serem \u201cgestores\u201d, \u201ccapit\u00e3es\u201d ou coisas que o valham, Kiso n\u00e3o esconde ser um s\u00e1dico. Ele destr\u00f3i planta\u00e7\u00f5es e rouba comida dos camponeses para dar aos seus soldados. Para sanar o t\u00e9dio, permite que os homens invadam as casas das pessoas e estuprem seus habitantes.<\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

Kiso \u00e9 um tirano, mas critic\u00e1-lo por ser \u201cautorit\u00e1rio\u201d \u00e9 perder de vista o mais importante. Ele n\u00e3o desrespeita o imperador porque est\u00e1 em uma cruzada popular contra a monarquia. Ele \u00e9 simplesmente imaturo e n\u00e3o gosta de se impor limites.<\/p>\n\n\n\n

Ele n\u00e3o destr\u00f3i planta\u00e7\u00f5es porque pratica uma a\u00e7\u00e3o calculada de terra queimada. Ele o faz porque tem um cavalo e, segundo ele, cavalos precisam comer.<\/p>\n\n\n\n

Ele n\u00e3o aterroriza a popula\u00e7\u00e3o como parte de um regime de medo \u2013 como tantos ditadores na era contempor\u00e2nea. Como um adolescente manhoso, ele acredita que o mundo gira em torno do seu umbigo, e as vontades dos outros n\u00e3o importam.<\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

O fil\u00f3sofo Harry Frankfurt<\/a> tem um nome para a postura de Kiso: devassid\u00e3o. <\/strong>Segundo ele, o devasso \u00e9 um indiv\u00edduo que age sempre de acordo com suas vontades imediatas. Ele n\u00e3o tem capacidade de se segurar e pensar no longo prazo; de considerar se aquele curso de a\u00e7\u00e3o, no fundo, \u00e9 o mais apropriado. Quando o desejo bate, \u00e9 com a for\u00e7a de uma abstin\u00eancia de droga.<\/p>\n\n\n\n

Quando o devasso \u00e9 contrariado, ele n\u00e3o consegue resistir \u00e0 vontade de mostrar o dedo do meio. Mesmo que ele seja um ministro<\/a>, e as \u201cofensas\u201d que recebeu sejam cr\u00edticas a sua atua\u00e7\u00e3o em um epis\u00f3dio de calamidade p\u00fablica.<\/p>\n\n\n\n

Quando o devasso sente vontade de fazer uma piada racista<\/a>, ele n\u00e3o tem como se segurar. Mesmo que os alvos da tro\u00e7a seja parceiros comerciais e seu gesto desencadeie uma crise diplom\u00e1tica.<\/p>\n\n\n\n

Quando o devasso perde, n\u00e3o tem esportiva para aceitar a derrota. Como uma crian\u00e7a que ainda n\u00e3o aprendeu limites, ele esperneia, grita que \u201cn\u00e3o valeu\u201d e amea\u00e7a levar sua bola embora. Mesmo que a \u201cderrota\u201d em quest\u00e3o seja uma elei\u00e7\u00e3o e a \u201cbola\u201d, o futuro do pa\u00eds.<\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

Pra Frankfurt, o devasso n\u00e3o \u00e9 s\u00f3 uma pessoa irrespons\u00e1vel. Ele n\u00e3o \u00e9 sequer uma pessoa. <\/strong>Como um animal selvagem, ele \u00e9 regido completamente pelas v\u00edsceras. Debater com um representante da laia \u00e9 uma perda de tempo. Ser governado por um, uma trag\u00e9dia.<\/strong><\/p>\n\n\n\n

O texto de Heike Monogatari <\/em>\u00a0d\u00e1 voz a esse sentimento:<\/p>\n\n\n\n

<\/p>\u201cA capital inteira fervia com os Genji,<\/em>
Que entravam em todos os lugares e cometiam incont\u00e1veis roubos.<\/em>
Mesmo em terras que pertenciam a Kamo ou Hachiman [i.e. sagradas],<\/em>
Eles ceifavam plantas de arroz ainda verdes para alimentar seus cavalos.<\/em>
Eles invadiam dep\u00f3sitos e tomavam o que havia dentro deles;<\/em>
Eles roubavam de viajantes e os privava de suas roupas.<\/em>
\u201cQuando os Heike controlavam a cidade\u201d, as pessoas diziam,<\/em>
\u201cO lorde Kiyomori era apenas uma vaga amea\u00e7a.<\/em>
Ningu\u00e9m roubava todas as suas roupas.<\/em>
Melhor os Heike que os Genji.\u201d<\/em><\/cite><\/blockquote>\n\n\n\n

Mais do que cruel, o devasso \u00e9 perigoso porque suas a\u00e7\u00f5es s\u00e3o arbitr\u00e1rias. <\/strong>Ao contr\u00e1rio de um tirano \u201cconsistente\u201d, que sempre retribui os aliados ou tortura seus inimigos, o devasso faz o que lhe der na telha.<\/p>\n\n\n\n

Ele \u00e9 o sujeito que cobre aliados de privil\u00e9gios em um momento, para mais tarde \u201cfrit\u00e1-los\u201d e salvar a pr\u00f3pria pele. \u00c9 o covarde que beija os p\u00e9s de seus superiores quando recebe uma intima\u00e7\u00e3o, mas volta atr\u00e1s nas palavras na primeira oportunidade.<\/p>\n\n\n\n

Apoiar um devasso \u00e9 como se pendurar na roda da fortuna. Parece bom enquanto estamos por cima, mas n\u00e3o sabemos qual momento de gl\u00f3ria ser\u00e1 nosso \u00faltimo.<\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

Em Heike Monogatari<\/em>, os aliados de Kiso aprendem isso da forma mais dif\u00edcil. Cansados dos seus desmandos, os pr\u00f3prios Genji enviam tropas contra ele. Num exemplo ainda mais chocante de devassid\u00e3o (infelizmente cortado da vers\u00e3o anime) Kiso cogita brevemente virar casaca<\/strong> e<\/strong> se unir aos Heike <\/strong>para salvar a pr\u00f3pria pele.<\/p>\n\n\n\n

\u00c9 f\u00e1cil tirar dessa parte da hist\u00f3ria a mensagem de que \u201cdevassos s\u00e3o ruins, e devemos expuls\u00e1-los da pol\u00edtica\u201d. Embora n\u00e3o deixe de ser verdade, \u00e9 uma li\u00e7\u00e3o f\u00e1cil \u2013 e pequena \u2013 demais para as ambi\u00e7\u00f5es do \u00e9pico. <\/p>\n\n\n\n

Algo que salta aos olhos quando apreciamos a obra nos dias de hoje \u00e9 a aus\u00eancia de protagonistas e antagonistas claros. N\u00e3o porque a hist\u00f3ria tenha uma moralidade cinza, mas porque fala de v\u00edcios e virtudes que v\u00e3o al\u00e9m de meras dinastias. <\/p>\n\n\n\n

Her\u00f3is ou vil\u00f5es, devassos ou comedidos, todos t\u00eam momentos de fraqueza, instantes de reden\u00e7\u00e3o, pecados a pagar.<\/p>\n\n\n\n

Apreciando a obra sob o ponto de vista da devassid\u00e3o, n\u00e3o \u00e9 dif\u00edcil entender o porqu\u00ea. Afinal,<\/p>\n\n\n\n

Um governo n\u00e3o precisa de ‘devassos’ para ser ele pr\u00f3prio devasso <\/strong><\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

A afirma\u00e7\u00e3o acima \u00e9 de Arthur Applbaum<\/a>, um dos pensadores que mais tem se dedicado a entender os efeitos da devassid\u00e3o na pol\u00edtica. Como ele explica, esse \u00e9 um problema que vai muito al\u00e9m dos populistas do momento.<\/p>\n\n\n\n

Tal como \u00e9 esperado de uma pessoa bolar planos e agir consistentemente, ele diz, um governo deve ser capaz de fazer o mesmo. Na verdade, \u00e9 ainda mais <\/strong>importante que um governo n\u00e3o seja governado pelos seus impulsos, pois a vida seu povo est\u00e1, literalmente, em suas m\u00e3os.<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Um indiv\u00edduo devasso pode matar algu\u00e9m em um surto de \u00f3dio. Um governo devasso pode exterminar toda uma popula\u00e7\u00e3o, destruir rela\u00e7\u00f5es diplom\u00e1ticas ou causar danos irrevers\u00edveis ao meio ambiente.<\/p>\n\n\n\n

Por incr\u00edvel que pare\u00e7a, diz Applbaum, esse governo n\u00e3o precisa ser formado por pessoas devassas. Uma c\u00fapula que n\u00e3o consiga tomar decis\u00f5es ou parar de brigar internamente pode, para todos os fins, agir de maneira indistingu\u00edvel a um devasso. Mesmo que seus membros sejam os sujeitos mais \u00edntegros, comedidos e racionais da face da Terra.<\/p>\n\n\n\n

Emprestando uma met\u00e1fora da fil\u00f3sofa Christine Korsgaard, Applbaum compara esse governo a um saco cheio de ratos. Presos com seus colegas, os animais v\u00e3o se mexer desesperadamente. Com o tempo, \u00e9 at\u00e9 capaz que o pr\u00f3prio saco \u201ccaminhe\u201d alguns cent\u00edmetros para um lado ou para o outro. Diante de um est\u00edmulo externo \u2013 por exemplo, um tapa \u2013 \u00e9 prov\u00e1vel que os ratos, por coincid\u00eancia, fujam para a mesma dire\u00e7\u00e3o. Por\u00e9m, n\u00e3o \u00e9 poss\u00edvel dizer que o saco aja, <\/strong>como se tivesse uma capacidade de c\u00e1lculo.<\/p>\n\n\n\n

Governos devassos s\u00e3o t\u00e3o perigosos quanto l\u00edderes devassos, pois reproduzem seu maior v\u00edcio: a arbitrariedade<\/strong>. Tal como um devasso pode decidir salvar uma pessoa em uma ocasi\u00e3o e mand\u00e1-la matar amanh\u00e3 por mero capricho, o governo devasso \u00e9 completamente imprevis\u00edvel.<\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

O Cl\u00e3 Taira de Heike Monogatari <\/em>\u00e9 um exemplo perfeito de governo devasso. Fiel aos coment\u00e1rios de Applbaum, nem todos os seus membros s\u00e3o ruins. No in\u00edcio do \u00e9pico, Shigemori, filho do patriarca Kiyomori, \u00e9 uma b\u00fassola moral para a fam\u00edlia. O nobre faz de tudo para preservar a reputa\u00e7\u00e3o da fam\u00edlia, chegando ao c\u00famulo de peitar o pr\u00f3prio pai \u2013 algo inimagin\u00e1vel segundo as normas sociais da \u00e9poca.<\/p>\n\n\n\n

Mesmo Kiyomori, a despeito de ser um tirano, nem sempre foi um devasso. Para tomar o poder durante a Rebeli\u00e3o Heiji <\/a>\u2013 uma guerra que precede os eventos do \u00e9pico \u2013 ele balanceou a trucul\u00eancia com doses copiosas de miseric\u00f3rdia.<\/p>\n\n\n\n

Seu principal rival, o l\u00edder Genji Minamoto no Yoritomo, por exemplo, passou anos se recusando a erguer um dedo contra os Heike. O motivo? Kiyomori havia poupado sua vida durante o conflito, a\u00e7\u00e3o pela qual ele ainda era grato. O patriarca dos Heike podia ser cruel, mas sabia que sua linhagem s\u00f3 se manteria no poder se planejasse para o futuro.<\/p>\n\n\n\n

Infelizmente, Shigemori e o jovem Kiyomori eram apenas dois ratos no saco escuro que era o cl\u00e3 Taira. Com a idade, Kiyomori se torna cruel e arbitr\u00e1rio. A toda e qualquer amea\u00e7a ele responde com viol\u00eancia, mesmo que isto s\u00f3 piore as coisas no longo prazo. Na verdade, ele sequer consegue pensar no longo prazo. No leito de morte, ele literalmente diz que seu \u00fanico desejo \u00e9 ver seu rival, Yoritomo, morto a qualquer custo.<\/p>\n\n\n\n

Os outros membros dos Taira s\u00e3o ainda piores. Munemori, outro filho de Kiyomori, cria um incidente pol\u00edtico por conta de um cavalo. Ele cobi\u00e7ava a montaria de Minamoto no Nakatsuna, do cl\u00e3 Genji. Quando Nakatsuna lhe disse que n\u00e3o lhe entregaria o cavalo, Munemori usou o poder da sua fam\u00edlia para tom\u00e1-lo \u00e0 for\u00e7a. N\u00e3o satisfeito, batizou o animal de \u201cNakatsuna\u201d para ridicularizar publicamente o nobre Genji.<\/p>\n\n\n\n

Mas o exemplo que melhor ilustra o ponto de Applbaum \u00e9 talvez o de Shigehira, um dos generais dos Taira. Enviado para refrear uma rebeli\u00e3o entre os monges de Nara \u2013 onde est\u00e3o alguns dos templos mais importantes do Jap\u00e3o \u2013 ele acaba acidentalmente ponto fogo em todo o complexo.<\/p>\n\n\n\n

A trag\u00e9dia gera um mal-estar de que os Taira nunca mais conseguiriam se descolar. Tempos depois, quando os ventos come\u00e7am a soprar em outra dire\u00e7\u00e3o e os inimigos da fam\u00edlia avan\u00e7am contra a capital, Kiyomori e seus descendentes at\u00e9 chegam a implorar pela ajuda de outros templos. Os monges, por\u00e9m, haviam aprendido sua li\u00e7\u00e3o:<\/p>\n\n\n\n

<\/p>\u201cSannou [, deus do Monte Hiei,] tenha piedade de n\u00f3s!<\/em>
Tr\u00eas mil monges, acrescentem sua for\u00e7a \u00e0 nossa!\u201d<\/em>
Esse foi o esp\u00edrito do apelo dos Heike,<\/em>
Mas sua conduta ao longo dos anos<\/em>
Ofendera demais os deuses<\/em>
E tra\u00edra toda a esperan\u00e7a dos homens.<\/em>
Suas preces n\u00e3o obtiveram resposta;<\/em>
Suas s\u00faplicas n\u00e3o convenceram a ningu\u00e9m.<\/em><\/cite><\/blockquote>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

Ao contr\u00e1rio de Kiso e Munemori, Shigehira n\u00e3o \u00e9 um devasso. A destrui\u00e7\u00e3o de Nara foi um erro t\u00e1tico que ele nunca tentou negar e pelo qual sempre se arrependeu. Como ele mesmo afirma antes de sua execu\u00e7\u00e3o, seu \u00fanico crime foi ter obedecido ordens de seus superiores. Coisa que s\u00f3 fez porque a alternativa – a execu\u00e7\u00e3o por desobedi\u00eancia – era pior. <\/p>\n\n\n\n

Infelizmente para Shigehira, seus \u201csuperiores\u201d eram um saco de ratos que tratava a pol\u00edtica como um jogo de acerte-a-marmota. A m\u00e3o que botou fogo em Nara pertencia a uma pessoa capaz de pesar a\u00e7\u00f5es e consequ\u00eancias, mas o governo que lhe deu a ordem reagiu \u00e0 rebeli\u00e3o dos monges como um animal selvagem a um cheiro desconhecido.<\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

Shigemori, o Heike “do bem”, at\u00e9 tenta, mas n\u00e3o consegue desviar o cl\u00e3 do precip\u00edcio a que se dirige. Embora sua vers\u00e3o liter\u00e1ria n\u00e3o tenha o mesmo dom da profecia de sua encarna\u00e7\u00e3o no anime, ela \u00e9 s\u00e1bia o suficiente para entender uma verdade dolorosa. Verdade que, \u00e0s v\u00e9speras de uma elei\u00e7\u00e3o presidencial que promete ser t\u00e3o desastrosa quanto a de 2018, far\u00edamos bem em aprender:<\/p>\n\n\n\n

Um governo, uma na\u00e7\u00e3o, \u00e9 maior que a boa vontade de um \u00fanico indiv\u00edduo. \u00c9 uma entidade grande demais – perigosa<\/strong> demais – para ser largada \u00e0 deriva. <\/p>\n\n\n\n

Coloc\u00e1-la de volta ao rumo n\u00e3o \u00e9 tarefa para devassos que prometeram \u201cse comportar\u201d, salvadores da p\u00e1tria ou autointitulados \u201ct\u00e9cnicos\u201d subordinados a minist\u00e9rios desgovernados.<\/p>\n\n\n\n

Precisamos, urgentemente, nos livrar desse saco de ratos. Ou ent\u00e3o estaremos, como os Heike, fadados a afundar no nosso pr\u00f3prio Estreito de Shimonoseki<\/a>.<\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

\u00c9 normal que cidad\u00e3os falem mal de seus pol\u00edticos. Viver em sociedade \u00e9 uma coisa naturalmente estressante. N\u00e3o escolhemos em que pa\u00eds, ou sob que tipo de governo, temos o infort\u00fanio de nascer. Ningu\u00e9m nos pergunta se queremos ou n\u00e3o obedecer \u00e0s leis. E aqueles que est\u00e3o no poder t\u00eam uma capacidade sem igual de […]<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":23073,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"spay_email":"","jetpack_publicize_message":"","jetpack_is_tweetstorm":false},"categories":[576,580,17],"tags":[45,752,226,753],"jetpack_featured_media_url":"https:\/\/i1.wp.com\/www.finisgeekis.com\/wp-content\/uploads\/2021\/12\/20211208-heike-cover-2.jpeg?fit=1600%2C1600&ssl=1","jetpack_publicize_connections":[],"jetpack_shortlink":"https:\/\/wp.me\/p9rUzW-5ZY","_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/23062"}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=23062"}],"version-history":[{"count":4,"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/23062\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":23077,"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/23062\/revisions\/23077"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/media\/23073"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=23062"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=23062"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.finisgeekis.com\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=23062"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}