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The Elder Scrolls – finisgeekis https://www.finisgeekis.com O universo geek para além do óbvio Sun, 24 Nov 2019 16:49:25 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.7.11 https://i2.wp.com/www.finisgeekis.com/wp-content/uploads/2019/02/cropped-logo_square.jpg?fit=32%2C32&ssl=1 The Elder Scrolls – finisgeekis https://www.finisgeekis.com 32 32 139639372 O cansaço com os ‘open worlds’ e o que significa se divertir https://www.finisgeekis.com/2016/03/07/o-cansaco-com-os-open-worlds-e-o-que-significa-se-divertir/ https://www.finisgeekis.com/2016/03/07/o-cansaco-com-os-open-worlds-e-o-que-significa-se-divertir/#respond Mon, 07 Mar 2016 23:04:39 +0000 http://finisgeekis.com/?p=2460

O fim dos anos 1980 teve os adventure games. Nos consoles, por volta da mesma época, os jogos de plataforma brilhavam. O final dos anos 1990 teve sua “Era de Ouro” dos RPGs isométricos. E os anos 2000 testemunharam a glória dos FPSs militares.

Durante toda a história dos videogames, alguns gêneros foram populares a ponto de marcar suas épocas e determinar (para o bem ou para o mal) o caminho a ser seguido pela indústria.

Entre os sucessos de Skyrim, GTA V, Witcher 3, Metal Gear Solid V  e tantos outros, a impressão atual é de que os games de mundo aberto se tornaram o “espírito da época” dos anos 2010 – e, quem sabe, de tudo o que virá pela frente.

Os números não mentem. Segundo uma estimativa, o gênero foi responsável por 30% de todos os jogos vendidos no ano de 2014. Minecraft, lançado cinco anos atrás, ainda marca presença na listas de bestsellers. O buzz em torno de No Man’s Sky, mundo aberto procedural que se gaba de exigir 4 bilhões de anos para ser completado, fala por si só.

De um ponto de vista tecnológico, há um certa beleza poética nisso tudo. A escritora de games Susan O’Connor certa vez disse que os jogos estavam chegando ao ponto de se tornarem iguais aos sonhos: tudo o que imaginamos pode ganhar vida.

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As gerações passadas chegaram perto

O mundo aberto é a realização mais extrema dessa utopia. Mais do que em qualquer outra época, mergulhar em um mundo paralelo – o tão sonhado “círculo mágico” – nunca foi tão fácil.

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Quem acompanha a blogosfera, no entanto, chega a uma conclusão diferente. Comentaristas têm escrito (e repetido várias e várias vezes) que o gênero está saturado ao ponto da exaustão. Na intenção de repetir os sucessos dos grandes hits da década, produtoras prezaram quantidade sobre qualidade, lançando no mercado uma infinidade de títulos similares e pouco inspirados.

Na opinião desses colunistas, o open world se tornou, de fato, o “espírito” da nossa época, mas não da forma que a indústria de games, com seus números gloriosos, parece indicar. Eles se tornaram o novo “always-online”, uma imposição arbitrária que nada acrescenta e muito prejudica.

É inegável que certos jogos de mundo aberto revolucionaram o mundo dos games. É também inegável que esses games se tornaram especiais justamente por não terem tido medo de entregar liberdade aos jogadores.

Porém, há mais em uma experiência inesquecível do que um mapa grande. Na intenção de repetir sucessos do passado, algumas produtoras parecem ter abatido os gansos dos ovos de ouro. Atentas aos detalhes – e a todo o jargão de marketing – elas se esqueceram do aspecto mais importante.

Sandbox e open world não são a mesma coisa

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Um indicativo tanto do sucesso quanto da decadência dos jogos de mundo aberto é a frequência com que  “sandbox” “open world” são tratados como sinônimos.

De fato, muitos games open world são sandboxes. Mas esses gêneros têm fundamentos bem diferentes, que podem nos ajudar a entender por que tantos games começaram a nos cansar – ou, pelo contrário,  porque alguns continuam a nos maravilhar.

Mundo abertos, fiéis ao próprio nome, são quaisquer jogos que nos dão a liberdade para explorar seu cenário da maneira como quisermos. Seu contrário são games de design linear, que “selam” certas partes do jogo (com loading screens, transições de nível etc) para controlar a experiência do jogador.

Mundo abertos, por si só, não dizem nada a respeito do conteúdo que o jogador possa encontrar. Um game pode adotar um level design aberto mantendo exatamente as mesmas limitações de seu equivalente linear, “salpicando” quests e NPCs por todo um mapa, em vez de concentrá-los em corredores ou salas pequenas.

O estilo tem seus fãs e suas vantagens, mas não necessariamente dá qualquer liberdade além da de locomoção. Em alguns casos, são um jeito simples (e um tanto de preguiçoso) de “inchar” um jogo, compensando falta de diversidade por volume.

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Não, Dragon Age. Nunca vou te perdoar

Sandboxes, por sua vez, são jogos que podem ser jogados “livremente”, sem um direcionamento autoral onipresente. A ideia, como o próprio nome já diz, é a do velho tanque de areia. O jogador pode produzir o que quiser, nos limites da sua própria imaginação.

tanque de areia

Em uma sandbox, a prioridade não é apresentar coisas interessantes, mas dar ao jogador ferramentas para que ele as desenvolva por conta própria. Como dizem alguns designers, pensar em sandbox requer encarar o jogo não como uma história, mas como um playground.

Até que ponto um mundo aberto deixa de ser uma sandbox é um assunto para muito debate – e uma boa dose de opinião. Os frequentadores do RPG Codex, famosos por seu purismo, certa vez fizeram circular o seguinte gráfico:

rpg codex sandbox

Nessa modelo, apenas os jogos realmente abertos, como Minecraft e os simuladores da série Tycoon pode ser considerados sandbox. Este ponto de vista não é compartilhado nem pelos grandes serviços de venda. No sistema de tags do Steam (alimentado por usuários), o rótulo sandbox é aplicado para Fallout, GTA e Skyrim, os três mundo abertos ma non troppo na figura acima.

Apesar desses jogos imporem limites à criatividade do jogador, é inegável que conservam o espírito de “faz de conta” que está na origem do gênero. Se perguntarmos a seus fãs, provavelmente ouviremos que aquilo que separa esses games de outros mundo abertos é a capacidade de “ir contra as vontades do jogo”. No caso de GTA, em especial, “quebrar as regras” se tornou uma subcultura em si.

No mundo do design de games, essa “rebeldia” tem um nome conhecido.

O gameplay emergente

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Eu já falei de jogabilidade emergente em minha coluna sobre os roguelites. Para recapitular, o gameplay é emergente quando o jogador tem espaço para inventar estratégias ou possibilidades que não foram pensadas pelos desenvolvedores.

No clássico Doom, certas pessoas notaram que correr na diagonal era mais eficiente do que seguir para a frente. O resultado foi uma geração de caçadores de demônios que andavam como siris.

Já no MMO War Thunder, jogadores descobriram uma estilo muito mais eficiente de ataque kamikaze.

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Em alguns casos, o entusiasmo é tanto que gamers chegam a criar não apenas estratégias, mas até objetivos próprios.

Quest nenhuma em Skyrim incentiva pessoas a fazer enormes montanhas de queijo (ou panelas, cabeças, ou qualquer outra coisa). O controle para apanhar e empilhar objetos, aliás, sequer é introduzido no tutorial. Isto não impediu jogadores de transformarem um RPG sobre um caçador de dragões em um episódio de Acumuladores.

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Da mesma forma, quando os desenvolvedores de Fallout 4 criaram um sistema de combate corpo-a-corpo, eles não previram que isso traria Saitama para a Commonwealth.

Essas brincadeiras não são apenas uma forma de descontrair ou de levar o jogo menos a sério. Na verdade, elas são a resposta de uma pergunta que certamente já ouvimos (ou fizemos) alguma vez na vida.

Por que jogos são tão viciantes?

Raph-KosterRaph Koster, um dos mais importantes teóricos do design de games, se perguntou isso uma vez. Ele chegou a uma resposta inusitada. Jogos viciam porque nos fazem aprender.

Para o designer, o “vício” dos games vem da sensação de desafio que sentimos ao “desbravar” um sistema. Encontrar a melhor combinação para uma equipe, construir o equipamento perfeito, descobrir a estratégia mais eficiente para derrotar um boss, garantir que nenhuma personagem morra.

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Todo jogo, no fundo, é um tipo de quebra-cabeça. Enquanto estamos tentando “encaixar suas peças”, a experiência nos anima. Por mais paradoxal que pareça, nós nos divertimos mais quando temos problemas para resolver.

Porém, infelizmente, somos seres inteligentes, e cedo ou tarde encontramos uma solução para qualquer desafio. Quando isso acontece, jogar deixa de ser uma descoberta e se transforma em um exercício arbitrário de grinding. As coisas passam a ser feitas apenas por fazer. Nas palavras de Koster, como um trabalho menial em um escritório.

A comparação do designer não podia ser mais certeira. Pelo menos um colunista disse que se cansou de games de mundo aberto porque se sentia em um segundo emprego. Ele não é o único. Alguns veteranos de MMO já contaram que, quando chegam em casa para jogar, sentem que estão saindo de um serviço para entrar em outro.

Quer dizer que jogos têm um “prazo de validade”? Não exatamente. A grande sacada de Koster foi perceber que as pessoas não paravam por aí. Bichos criativos como os seres humanos são, quando gamers “esgotam” os problemas do jogo eles começam a criar os seus próprios.

Missões solo, builds alternativas, personagens fora dos moldes. Homenagens à cultura pop, caminhos inusitados, faz de conta. Com um pouco de criatividade e um jogo aberto o suficiente, um mesmo game pode se transformar em dois, três ou quatro bilhões.

Skyrim, GTA, Just Cause e similares não conquistaram nossa geração  apenas por serem mundo aberto, mas por encorajarem o gameplay emergente. Na ideia de replicar seu sucesso, certas produtoras miraram no alvo errado. Não importa quantos quilômetros quadrados um mapa tenha, quantos colecionáveis estejam espalhados, a quantos níveis se possa subir. Sem a liberdade para criarmos nossos objetivos, games são apenas trabalho.

Os jogadores sabem disso, e é por essa razão, eu imagino, que a nova “moda” está deixando tantos desafetos. Tal como os roguelitessandboxes nos entregam uma coisa única. Em tempos de gráficos cinemáticos e comparação com outras mídias, elas proporcionam uma experiência 100% lúdica. Quando nos acostumamos a isso, é difícil voltar atrás.

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‘Liberdade de escolha’, ou como os video games nos enganam https://www.finisgeekis.com/2015/09/21/liberdade-de-escolha-ou-como-os-video-games-nos-enganam/ https://www.finisgeekis.com/2015/09/21/liberdade-de-escolha-ou-como-os-video-games-nos-enganam/#comments Mon, 21 Sep 2015 21:04:59 +0000 http://finisgeekis.com/?p=699 O mundo dos games é repleto de chavões. Dentre eles, pouco são mais usuais (e controversos) do que “liberdade de escolha”. Fãs de RPG, em particular, terão dificuldade em encontrar qualquer análise aprofundada de seu jogos favoritos que não esbarre na expressão ou em suas parceiras: “escolhas significativas”, “histórias customizáveis”, “narrativas ramificantes”, “agência”.

À primeira vista, parece que há uma demanda para que games se tornem playgrounds virtuais, ferramentas para que os jogadores brinquem de faz-de-conta e inventem as próprias histórias. Eu mesmo já me deparei com isso. Ano passado, após dar uma palestra sobre video games, ouvi um membro da plateia dizer que jogava para “ser ele mesmo”, com todas as opções e nuances do mundo real. Jogos que chegavam perto disto eram jogos bons.

Isso, é claro, à primeira vista. Basta estourar uma pipoca e observar as trocas de farpas entre profissionais da indústria para ver que nem entre desenvolvedores há um consenso sobre o que significa ser “livre” e “entrar na pele” das personagens. Pior: nem se essas duas coisas, ou qualquer outro dos chavões do primeiro parágrafo, têm necessariamente a ver um com o outro.

Em 2010, Daniel Erickson, diretor de roteiro da Bioware, soltou os cachorros sobre Final Fantasy XIII. Segundo ele, o game não era um RPG, e colocar um “J” na frente não enganaria ninguém:

Você não faz escolhas, você não cria uma personagem, você não vive a sua personagem… Eu não sei o que eles são – adventure games, talvez? Mas eles não são RPGs.

Não bastou nem dois anos para que o feitiço voltasse contra o feiticeiro. Em 2011, Dragon Age II, sequel da IP de sucesso da Bioware, foi malhada por incluir um protagonista não customizável e ter um enredo pouco reativo.

No ano seguinte, Mass Effect 3 acendeu a internet em chamas com uma das sequências finais mais controversas da história. A polêmica foi tão grande que uma versão “consertada”, ajustada aos interesses do público, foi lançada no mesmo ano. O episódio foi impactante a ponto de alguns terem sugerido que Half Life 3 custa a sair porque os desenvolvedores estariam com medo de uma reação similar por parte dos fãs.

Talvez haja algum fundo de verdade nos comentários de Erickson. Mesmo assim, ele deveria, nos dizeres de Bill Gates, ter arrumado o próprio quarto antes de tentar mudar o mundo. É verdade que JRPGs não oferecem o mesmo tipo de “liberdade” de que a Bioware se gaba. Mas até que ponto o modelo “ocidental”, “sem o J” de Erickson vive às suas próprias expectativas?

Para responder a essa pergunta, é necessário voltar  no tempo.

‘Interatividade’…. até quando interessa

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Nos anos 1980, quando computadores eram uma novidade e a maioria das pessoas sequer sabia o que eram videogames, Brenda Laurel propôs uma ideia pioneira. Segundo ela, softwares tinham muito em comum com o teatro. Tal como as peças, eles eram compostos por uma série de elementos que deveriam funcionar em conjunto, do código à interface. Para que tudo opere como esperado, é necessário que esses elementos estejam orientados por um projeto geral do autor, e que esse projeto seja traduzido para a dimensão material da obra. Se o criador pesar a barra em seu plano, a ideia parecerá inacabada ou forçada. Se, por outro lado, ele estiver escondido demais, o público encarará o que se passa sem fazer ideia do que significa.

Deve haver uma obra de arte escondida aí...

Deve haver uma obra de arte escondida aí…

Brenda Laurel influenciou teóricos e designers, que se basearam nesses princípios para criar experiências em que as ações dos jogadores tivessem maior impacto. O que eles perceberam foi que games com escolhas relevantes são justamente aqueles em que essa balança está em equilíbrio.

Se ela pende para o lado do autor, chegamos no famoso railroading: a sensação de sermos “carregados” para finais que não necessariamente desejamos. Se ela pende para o lado material, temos conteúdo filler, que parece estar no jogo apenas para gerar volume.

Em Dragon Age II, templários e magos entram em guerra e destroem Kirkwall, independente dos esforços do protagonista para impedi-los. A vontade dos autores de contar sua história e preparar terreno para o jogo seguinte falou mais alto que seu desejo de deixar as rédeas nas mãos dos jogadores.  Em Mass Effect 3, o plano de Casey Hudson e Mark Walters de autorar uma ficção científica “cabeça” pesou além da conta sobre uma série que se propunha a ser a versão digital de um livro de “escolha sua aventura”.

choose your own

Por outro lado, as caças aos shards, mosaicos, garrafas e quebra-cabeças de Dragon Age: Inquisition parecem filler porque não conseguimos ver um sentido geral por trás delas. O problema não está na natureza das quests. Os audio diaries de Bioshock são essenciais à narrativa, e nos trazem enorme satisfação ao serem encontrados. Ambas são “caças ao tesouro”: uma pecou pelo excesso; a outra achou a medida certa.

Isso mostra que, contrário à sabedoria popular, mais nem sempre é melhor. Se não está claro como as decisões se relacionam com a ideia central,  há alguma coisa de errado com estas decisões, e a impressão que elas passarão com certeza não será de liberdade.

Eu insisto em “impressão’. Folheiem um guia de estratégia de um jogo que gostam e verão que, na maioria das vezes, o potencial de escolha é muito pequeno. Se os desenvolvedores são generosos, vocês terão alguns finais diferentes. Na maioria das vezes, uma dezena de variações dos mesmos finais, ou um punhado de escolhas significativas ao longo de 50h de aventuras. Levante a mão quem nunca jogou um grande RPG, voltou do começo para fazer uma aventura completamente nova e descobriu que certas coisas não mudariam.

A questão, portanto, não é de prometer liberdade infinita, mas de fazer a pouca liberdade de que os jogadores dispõem parecer aceitável. Há uma série de truques para isso, alguns dos quais são mais antigos que os próprios games. Abaixo vão três dos meus favoritos.

Esconder o plano geral dos jogadores

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Esse é um ponto que mestres de RPG já conhecem de cor e salteado. Os jogadores não precisam saber que a Cidade A que eles visitaram é exatamente igual à Cidade B que eles decidiram não conhecer. Tampouco precisam, após perderem os cabelos derrotando um boss, saber que você os deixaria ganhar de qualquer jeito.

Isso é possível porque há dados que são escondidos dos jogadores. Sem ter mapas ou descrições das cidades, eles não têm como saber se o mestre os está conduzindo com uma guia. Sem informações sobre pontos de vida, habilidade ou classe de armadura dos montros, eles não fazem a menor ideia do tamanho dos desafios que encontram.

Um mestre astuto consegue engambelar seu grupo por sessões a fio sem que ninguém perceba. O resultado é uma história em que as regras estão lá apenas como referência e em que o mestre decide, como o “líder” de um faz-de-conta entre crianças, quem viveu e quem morreu.

Antes que vocês abram aquele sorrisinho maldoso e enviem esse texto para aquele seu colega que faz isso, saibam que essa tática é tão eficiente, popular e desejada que virou dica oficial no Livro do Mestre da 4a edição de D&D:

Se você ver que as personagens estão obviamente dominadas em um encontro, você pode:

  • Dar às personagens uma rota de fuga
  • Fazer escolhas ruins de propósito para os monstros
  • “Esquecer” de rolar o dado para ver se monstros recarregam seus poderes
  • Inventar um motivo dentro da história para os monstros abandonarem a luta
  • Deixar os monstros ganharem, mas deixar as personagens vivas por algum motivo.

(…)

[Se um encontro estiver fácil demais], você pode aumentar a dificuldade na medida em que as coisas andam. Traga reforços. Dê ao vilão uma habilidade nova da qual os jogadores não sabiam. 

Em videogames isso é ainda mais crucial do que em jogos de tabuleiro. Nenhum software, por mais complexo que seja, conseguirá ser tão rico quanto a imaginação.

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Não, nem Daggerfall

A diferença entre um jogo bom e ruim muitas vezes jaz em uma coisa tão simples como saber o que esconder e por quanto tempo. Em Heavy Rain, escolhas erradas em alguns momentos-chave levam à morte das personagens. Porém, ao anunciar que “ninguém está à salvo” e que suas decisões podem condenar quase todo mundo, os desenvolvedores criam um véu de tensão que faz até os quicktime events mais banais parecerem significativos.

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Caro David Cage: só não exagere na dose. ALGUMAS decisões reais são necessárias, caso contrário perde a graça

Na maioria das vezes, isso é feito de forma sutil. Vários jogos, a exemplo do mestre de RPG que citei, escondem informações cruciais dos inimigos, de fraquezas a pontos de vida. Quando bem feito, isso torna o jogo muito mais difícil e imprevisível, exigindo que pensemos duas vezes antes de chutar o menor dos goblins.

É o famoso “tigre de papel”. Após alguns playthroughs, pode até ser que deduzamos a lógica da coisa e encontremos um “caminho ótimo” para chegar ao final. Com o tempo, nós logo veremos que a maior parte das ameaças é pífia se encarada do jeito certo ou no nível ideal. Na primeira vez, no entanto, cada mísera escolha será tomada com o suor a escorrer da testa.

Trilhas de migalhas

Fonte

Entregar a história de mão beijada, seja via cutscenes ou diálogos expositivos, não é a coisa mais excitante do mundo. Para contornar este problema, designers muitas vezes “quebram” as informações relevantes da história e as espalham pelo mundo do jogo.

Esses resquícios podem ser qualquer coisa: ruínas, campos de batalha, livros ou mensagens escritas, cadáveres, rumores sussurados por NPCs, gravações ou mesmo visões fantasmagóricas. Nenhum conta uma história completa, apenas uma “peça” que, juntada as outras, ganha um sentido.

Se a diferença parece minúscula, na prática ela é gritante. Aqui, por mais linear que o enredo seja, é sempre do jogador o papel de colocar as coisas em ordem. Rondar cada centímetro de Columbia em busca de voxophones nos dá um sentimento muito maior de agência do que escutar uma narração em off por vinte minutos.

Para aqueles de vocês que curtem um palavreado técnico, o nome disso é paradigma indiciário. O termo foi cunhado pelo historiador Carlo Guinzburg para denotar a capacidade de reconstruir um todo a partir de traços. É o princípio do romance policial. A diferença é que é o jogador, implicita ou explicitamente, que veste a boina do Sherlock Holmes.

Para Guinzburg, trata-se de uma habilidade cultivada desde os caçadores da idade da pedra. Na perseguição por pegadas, sangue e outros rastros de animais, aprendemos a narrar o que havia acontecido com eles e para onde eles iriam. De uma atividade de sobrevivência surgiu nosso dom de contar histórias.

Geralt, o romancista

Geralt, o prosador

Justamente por ser tão básica e fácil de usar essa técnica pode ser encontrada em praticamente todo game narrativo. Ela está presente no prólogo de The Last of Us, em que exploramos a casa de Joel e descobrimos quem ele é, que tipo de relação tem com a filha e o que está acontecendo com o mundo. Ela é o elemento crucial em Bioshock e em adventure games como Gone Home, cujas histórias dependem da interação com objetos. Ela aparece de maneira literal nos contratos de monstros de Witcher 3 e em todos os jogos de investigação. Não que precisemos ir tão longe: nós a vemos em virtualmente todos os dungeons de Skyrim, por meio de notas, cadáveres estrategicamente posicionados e NPCs tagarelas.

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Aquela hora em que nos damos conta de que Skyrim tem um índice de analfabetismo menor do que o do Brasil

Mundos dinâmicos

 

Em 2011, Witcher 2 fez os queixos da crítica caírem ao incluir uma decisão tão, mas tão relevante que mudava completamente o segundo ato do jogo. Para ver tudo o que o game tinha a oferecer, não havia saída a não ser jogá-lo (quase) inteiramente uma segunda vez.

A verdadeira narrativa ramificante é um sonho de muitos gamers, mas quem já tentou colocar a ideia no papel– ou apenas já brincou no Aurora Toolset de Neverwinter Nights – sabe o pesadelo que é pô-la em prática.

aurora toolset

Meus olhos doem…

Se cada escolha “mudasse para sempre o universo”, como prometem as contracapas de vários games, jogos seriam infinitos e impagáveis. E isso sem contar as pressões editoriais. Como o escritor da Bioware Patrick Weekes disse num depoimento três anos atrás, o railroading às vezes é uma exigência do escritório de cima. Em um mundo de gamers que só jogam um título uma única vez ou nem chegam até o final e de empresas como a EA que vivem de nivelar por baixo, impedir o jogador de acessar conteúdo (como vez Witcher 2) nem sempre é aceitável.

Quem acompanha a série Elder Scrolls há mais de uma década sabe a pena que isso é. Em Morrowind, as diferentes facções do jogo têm suas rivais, e para prosseguir em suas quests é necessário destrui-las. Deseja se tornar grão-mestre da Guilda dos Magos? Prepara-se para caçar agentes Telvanni. Quer liderar a Guilda dos Guerreiros? Para tanto, é necessário ou eliminar a Guilda dos Ladrões ou organizar um motim e tornar-se mestre à força. Seja como for, o resultado é dramático: personagens-chave morrerão e, com elas, quests, diálogos e oportunidades específicas. Compare isso com Skyrim, em que um único personagem pode se unir a todas as facções, quest-givers são imortais e os impactos de suas ações na postura de NPCs são quase imperceptíveis.

A solução é contar com pequenas escolhas espalhadas ao longo do jogo. Elas não precisam ser relevantes ou mesmo associadas à trama principal. Pelo mero fato de estarem lá – e em grande número – passam a sensação de que o protagonista causou uma diferença no mundo à sua volta. Jogos não são apenas histórias, mas lugares virtuais que habitamos por algum tempo. Deixar nossas marcas nesses lugares muitas vezes é mais importante do que ver um slideshow diferente no epílogo da jornada.

Isso é o que Mass Effect, para a infelicidade de seus criadores, fez bem demais. O terceiro jogo da série contou com mais de 1000 pontos de variação com base em decisões feitas nos dois anteriores. A maioria dizia respeito a side quests formulaicas, easter eggs ou fanservice, mas não importa. O jogo passou a sensação de que as ações de Shepard, por menores que fossem, mudariam a vida das pessoas a sua volta. Quando o mesmo não aconteceu com as “grandes” decisões – e, nestas dimensões, não tinha mesmo como acontecer – a internet pegou fogo.

Para alguns, o que separa um grande criador de um medíocre é a capacidade de se virar com pouco. Dê a um chef tomate, azeite, farinha, água e sal e ele fará um banquete a ser lembrado. Coloque um leigo em uma cozinha industrial e ele queimará sua torta do mesmo jeito. Não se trata de inspiração divina ou talento nato, mas da ideia de que bons criadores conhecem seus limites e sabem fazer o melhor sem pisar fora deles.

Se isso é verdade, sem dúvida se aplica aos games também. Os recursos e possibilidades para criar um jogo dos sonhos sempre serão limitados. A marca da experiência inesquecível é a lábia de seus criadores em  “mascararem” as costuras de seus universos de faz-de-conta.

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Dragon Age: O Charme do Desconhecível https://www.finisgeekis.com/2015/03/09/dragon-age-o-charme-do-desconhecivel/ https://www.finisgeekis.com/2015/03/09/dragon-age-o-charme-do-desconhecivel/#respond Mon, 09 Mar 2015 20:02:45 +0000 http://finisgeekis.com/?p=78 É possível sentir saudades de um lugar  que não existe?

Os protetores da memória dirão que não. Podemos nos iludir até cansarmos, inventarmos quantos refúgios quisermos para driblar qualquer senso de perda. Os espaços, objetos e pessoas que compõem nossa identidade independem de sortilégios psicológicos. Eles atendem a uma demanda maior: dizer o que somos, com quem devemos andar e o que precisamos deixar para o futuro. Contra isso, podemos reunir todos os mapas fajutos queimados nas pontas, as narrações em off e os rip-offs de trilhas do John Williams. Não muda nada. Uma coisa só é real se for real.

Gamers, no entanto, dirão diferente. Puxe um jogador de The Elder Scrolls à conversa e ele dirá quem é quem nas ruas de Sadrith Mora e qual o melhor lugar para se comprar comida em Whiterun. Chame um fã da Bioware ao desabafo e você escutará sobre as dores da traição do Jacob, o seu triângulo amoroso com o Alistair e a Leliana e o sacrifício dos Bull’s Chargers na Storm Coast. Pergunte sobre a primeira vez em que jogaram seus jogos e eles a compararão a uma viagem: por uma semana (ou um mês, ou um ano), Cyrodiil, Ferelden, Skyrim ou Orlais foram lugares em que de fato viverem, povoados com pessoas com quem de fato conversaram, e que deixaram lembranças mais vivas que qualquer foto.

O que diz de nós quando uma experiência virtual se torna mais verídica que o mundo de carne e osso? Somos nós que estamos impressionáveis ou é o mundo que ficou real de menos?

Quem conta um conto aumenta um ponto

Se RPGs de fantasia como TES ou Dragon Age passam a sensação de um mundo pulsante e fidedigno, não é só pela beleza gráfica, a complexidade de sua lore ou seu “realismo técnico”. Nem mesmo simplesmente por podermos alterá-los à revelia. Tamriel e Thedas são mundos cativantes em parte porque se mostram detentores de um passado e se projetam ao futuro, seja ao reagir (e acolher) as ações dos jogadores, seja no seu riquíssimo misto de tradição, mistérios e surpresas.

Muito do charme está não no que se sabe, mas justamente no que é desconhecido – e no que não é sequer sabível. Se muitos jogos entregam seu cenário como cartas marcadas, TES e Dragon Age apelam ao incerto e à nossa intrínseca curiosidade pelo disputável. Seus mundos não só não têm “certos e errados”, como também não separam entre religião e superstição, história e propaganda, deuses e mitos. Em sua jornada pelas terras fantásticas, o jogador não conta com a “verdade”, mas com versões; com os fiapos de informação que resgata de ruínas antigas e com a bagagem cultural de seu próprio personagem e sua predisposição a relevar algumas coisas em favor de outras. Em Dragon Age: Origins, o processo é literal. Vislumbramos um pouco do mundo do nosso avatar antes de, em seus pés, sermos atirados à demanda do destino. Se o restante do jogo não é lá muito diferente, o mesmo não podemos dizer das primeiras impressões. Como diz o “loremaster” de TES: Online, não há uma única verdade sobre o mundo; cada um o enxerga a partir de seu ponto de vista.

A despeito disso, TES faz pouco com o que tem em mãos. Como bem sabem aqueles que viveram a juventude com Morrowind, é possível jogar por centenas de horas sem abrir um único livro virtual, sem questionar pontos finos da lore ou mesmo prestar atenção à narrativa vaga que amarra as várias missões. Os incentivos para tanto são mínimos. Ruínas dwemer existem para serem exploradas, cidades para se obter missões e suprimentos, templos daédricos para se tentar a morte. O resto é cosmético. Em Dragon Age, em contrapartida, a lore é indissociável da experiência. No colo do protagonista são postas decisões que afetam toda uma realidade – incluindo a perspectiva de jogos futuros. Para se informar, não há “guia definitivo” ou livro sagrado. O que chega ao jogador são depoimentos, diálogos e entradas do códex, a enciclopédia virtual do jogo. Todos, da fofoca da taverna às escrituras divinas, têm seus próprios autores, vieses e propósitos ulteriores.   Um mundo que vive em conflito sobre sua própria definição é mais do que um mundo “realista”. É um mundo que passa a impressão de existir para além de nossa interferência. Isso torna nossa participação ainda mais especial – para o mundo, sem dúvida. Mas, fundamentalmente, para nós também.

Contudo, há algo a mais aqui. O escritor de Dragon Age, David Gaider, pode negar quanto quiser, mas há algo de nosso, do mundo real e do passado que de fato existiu, em sua criação. Assim nos diz Matt Goldman, o diretor de arte de DA: Inquisition, numa entrevista que deu para o guia de estratégia:

A premissa do Dragon Age é a exploração do que aconteceria se barganhas fáusticas fosse uma possibilidade real. O mundo de Thedas se balança em um momento estranho – como uma Europa do thomas moreIluminismo que não consegue se libertar das amarras da religião porque os demônios existem de verdade. A natureza de forte advertência dos arcos narrativos e esses paralelos históricos me levavam de volta aos pintores renascentistas setentrionais como Breughel e Holbein.

Esse retrato de Sir Thomas More é para mim uma perfeita síntese do dilema moral de Dragon Age (…). Sir Thomas More foi um humanista progressista, diplomata e escritor. Ele foi também um inquisidor e lutou contra a Reforma Protestante com métodos “tradicionais”. Um homem muito inteligente e de grande compaixão, pego entre o passado e o futuro.

 

O que talvez fosse de se esperar de uma franquia que adota um marcador temporal como título, a intenção não é apenas mostrar uma época distante, mas uma época que muda. Daí a necessidade de jogar a mudança nas mãos do gamer, tanto na forma de dilemas a serem resolvidos (aliar-se aos templários ou debandar a ordem? Colocar Alistair ou Anora no trono?) como em acasos maiores que nos aparecem independente do que façamos (a batalha de Kirkwall, a blight, o sumiço dos grey wardens). Pois, se as coisas mudam, nem sempre mudam para onde queremos, nem quando queremos. Coisa que Sir Thomas More sabia muito bem.

 Escapando para o real

Vamos, EI. Tente destruir minhas estátuas agora.

Vamos, terroristas. Tentem destruir minhas estátuas agora.

Toda fantasia, obviamente, tem suas referências, e nada é mais exótico do que nossa própria realidade. Daí os dwemer, “elfos das profundezas” de TES, serem modelados nos antigos assírios, o “Imperium” de Tevinter de Dragon Age se comunicar em um latim de faz-de-conta e o mundo de Thedas nos apresentar a uma coleção de pastiches medievais (avvars, banns, templários) que foram progressivamente “desmedievalizados” de jogo para jogo.

Mas quando essas referências são mobilizadas em um universo vivo e dinâmico, em que a participação do jogador é levada em conta, a coisa muda. De menções rasteiras aos “povos ancestrais”, passa-se a um mundo em miniatura parecido com o  nosso. É difícil dizer quem tem razão em uma guerra sobre memória, ou quem está certo nas disputas morais do nosso tempo. O velho “tudo é relativo” só funciona até certo ponto e, quando precisamos de respostas, não há fórums ou wikis que nos ajudem. Mas a guerra entre magos e templários, a natureza dos demônios, a existência do Maker e a identidade de Mythal são questões mais diretas. Não são “fáceis” porque essa nunca foi a intenção, porém num meio constantemente louvado por se tornar mais “realista”, elas conseguem tornar palpável a mais pesada das realidades: as dúvidas e as inquietações humanas.

Há quem diga que fugir do que somos é, ironicamente, parte da nossa natureza. O mais interessante é o que nos leva a fazer isso. Os mundos breves de Tamriel e Thedas são mais simples e, por isso mesmo, mais ordenados, didáticos e claros do que o mundo de fora dos monitores. Nisso eles parecem, por vezes, mais reais.

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