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Night is Short Walk on Girl – finisgeekis https://www.finisgeekis.com O universo geek para além do óbvio Mon, 26 Aug 2019 19:35:31 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.7.11 https://i2.wp.com/www.finisgeekis.com/wp-content/uploads/2019/02/cropped-logo_square.jpg?fit=32%2C32&ssl=1 Night is Short Walk on Girl – finisgeekis https://www.finisgeekis.com 32 32 139639372 “The Night is Short, Walk on Girl”: O gênio eufórico (e aéreo) de Tomihiko Morimi https://www.finisgeekis.com/2019/08/26/the-night-is-short-walk-on-girl-o-genio-euforico-e-aereo-de-tomihiko-morimi/ https://www.finisgeekis.com/2019/08/26/the-night-is-short-walk-on-girl-o-genio-euforico-e-aereo-de-tomihiko-morimi/#respond Mon, 26 Aug 2019 19:35:31 +0000 http://www.finisgeekis.com/?p=21956 Primeiras impressões, diz o ditado, são as que ficam. E meu primeiro contato com Tomihiko Morimi, um dos “mais populares escritores contemporâneos do Japão” segundo quem entende do mercado, não foi positivo.

Penguin Highway, sobre o qual escrevi aqui, passou longe de me impressionar. Sua prosa era insossa; sua história, soterrada sob a voz de um protagonista antipático. Para o autor de não um, mas dois romances adaptados pelo celebrado Masaaki Yuasa, ver sua estreia em águas ocidentais na forma de um romance tão insípido não foi o melhor cartão de visita.

Aparentemente, o Deus dos Livros deve ter ouvido minhas preces. Yoru wa Mijikashi Aruke Yo Otome (The Night is Short, Walk on Girl) uma de suas parceirias com Yuasa, acaba de ser publicada em inglês. Ansioso pela oportunidade de dar ao escritor uma segunda chance, só pude interpretar o lançamento como um sinal do destino.

Quão irônico, portanto, que o romance verse justamente sobre Deuses dos Livros e preces e sinais do destino.  E quão feliz que sua prosa, ágil, criativa e cheia de coração, tenha subvertido completamente meus preconceitos.

A trama

“O Senhor Todou é um homem de meia-idade, o astuto gerente do Centro de Carpas Todou em Rokujiro e um filósofo sobre o sentido da vida. Quando, no final de maio, eu saí em busca de um drinque, o Sr. Todou foi a primeira pessoa que encontrei. Se eu não tivesse trombado com ele, eu não teria terminado em um certo bar em Kiyamachi, eu não teria sido bolinada, eu não teria sido resgatada pela Srta. Hanuki, eu não teria conhecido o admirável Sr. Higuchi, eu não teria conhecido o Sr. Rihaku, ou o presidente, ou qualquer um dos outros, e meu mundo continuaria tão pequeno quanto a testa de um gato.”

Sabemos que estamos diante de um livro singular quando não conseguimos sequer resumir seu enredo. Eufórica e hilária, a trama de The Night is Short parece fugir de uma definição simples com o mesmo empenho que suas personagens fogem da normalidade para viver a melhor noite de suas vidas.

Isso não significa que o romance não tenha foco. Pelo contrário, sua história é estruturada com um esmero quase acadêmico, dividida em quatro partes que representam quatro episódios memoráveis na vida de duas pessoas: uma estudante universitária e seu veterano.

A garota tem uma personalidade inconfundível, um otimismo contagiante e uma resistência sobrenatural à bebida.   “Num mundo cheio de atores tentando […] se manejar até o papel principal”, o veterano escreve, “ela era estrela da noite sem ao menos tentar”.  O rapaz, como seu tom não deixa mentir, está apaixonado por ela. Ao longo de um ano, em aventuras cada vez mais absurdas, ele fará de tudo para ganhar seu coração.

Em um romance menos inspirado, poderia ser apenas o pretexto da cruzada de um homem em busca de sua musa. Morimi, porém, dá a voz a ambos, transformando-os em narradores – e protagonistas – de suas vidas.

Os cortes não seguem uma periodicidade clara, e Morimi dá pouca indicação de quem estamos ouvindo. São as próprias personagens, disputando nossa atenção como numa roda de conversa, que se revezam para nos contar as proezas de uma noite inesquecível.

E que noite! De uma festa de casamento que degringola em um pub crawl em Ponto-Cho, tradicional bar boêmio de Kyoto, os encontros e desencontros dessas duas personagens eventualmente tomam proporções épicas. Suas confusões nos levam a feiras de livros, tornados repentinos, pimentas alucinógenas; à companhia de um “agiota tão inumano que não derramava nem sangue nem lágrimas”, mas confiscava livros de valor sentimental;  de um clone endiabrado do Conte do Monte Cristo e até mesmo de um Deus dos Resfriados que ameaça adoecer toda a humanidade.

Bairro de Ponto-Cho, em Quioto. Fonte

“Como um tofu de amêndoas”

Dizer que sua prosa é visual é quase um desserviço para a imaginação e bom-humor que saltam de cada página. Morimi pinta não apenas com cores, mas também com gostos, cheiros, texturas e ruídos. Encontrar um lugar comum em seu texto é tão difícil quanto achar as chaves de casa após uma noite de bebedeira. E, tal como em uma madrugada bem curtida, nem sempre temos certeza do que estamos experimentando.

“Sábios leitores” diz o veterano no capítulo de abertura “saboreiem a fofura [da garota] e a minha estupidez; desfrutem  o sabor sutil e requintado da vida, não muito diferente daquele de um tofu de amêndoas.”

Annin tofu ou tofu de amêndoas. Espécie de manjar típico da culinária chinesa

Todou, um quarentão pervertido, sorria como “um pedaço de papel amassado”. Seu rosto “tinha uma notável semelhança com a ponta de um pepino coberta de limalhas de ferro.”

A garota acha sua mão feia como “uma massa no formato de uma folha de maple”. O “amuleto” que recebe de um colecionador de arte erótica “não era nem um canhão nem uma carpa, mas inconfundivelmente o monstro do desenho – isto é, por mais que eu hesitasse em dizer, um espécime da assim chamada masculinidade”.

Um gênio eufórico… e aéreo

Como categorizar um escritor desses? Sua prosa é mais rebuscada que uma light novel, mais despretensiosa que o politizado realismo mágico, mais deliberadamente “japonesa” que a fantasia urbana, despatriada de seu conterrâneo Haruki Murakami.

Uma de suas personagens cria carpas ornamentais, que em vários momentos chovem sobre as personagens em cenas dignas de Kafka à Beira Mar. Outra, uma jovem cujo passatempo é invadir festas e lamber desesperadamente quem encontra pela frente, é descrita como uma “mulher-peixe”.

O boêmio Higuchi, amigo de Hanuki,  tinha “a pose de um grande Buda reclinado” e sorria com a “expressão enrugada de uma máscara de teatro Noh”. Ele diz que sua profissão é ser um tengu. Vendo suas façanhas ao longo do livro, — que incluem conjurar carpas da boca e maneki nekos de seus ouvidos – começamos a nos perguntar se não pode ser verdade.

Várias sub-tramas dizem respeito a um grupo de colecionadores de Shunga – nas palavras da heroína, “homens e mulheres entrelaçados como anéis de quebra-cabeça e algum tipo de monstro enrolado em volta das suas partes pudentas.” Boa sorte para ler esse livro em público sem cair em gargalhada.

Podemos apenas imaginar quantas outras referências e jogos de palavra não se perderam na tradução. A versão para o inglês de Emily Balistrieri é leve e fluida, mas peca pelo excesso de didatismo, acompanhando termos japoneses por seus equivalentes ocidentais:  “Eu sou um goblin tengu”; “[ele] relaxava em uma yukata, uma roupa tradicional”; “eu olhei de volta para a cara feia de um boneco Daruma – um boneco japonês redondo e vermelho de um homem ranzinza e barbado”.

Por um lado, é realmente impossível acompanhar o romance sem dominar essas referências. Por outro, é questionável até que ponto um leitor que não saiba o que é um boneco Daruma conseguirá sobreviver no Bairro da Liberdade animado que é a prosa de Morimi.

Produtos japoneses em loja do Bairro da Liberdade. Fonte

 

 

Se The Night is Short entrega menos do que promete é no seu compromisso, quase militante, em não se comprometer com nada.

Enquanto que outros escritores usam o absurdo para questionar a realidade ou endereçar traumas, Morimi parece, como sua protagonista, querer apenas curtir o momento.

Sua escrita não pesa com nenhuma angústia profunda, nenhuma grande questão que precise de resposta.

Inferior como é em qualidade literária, Penguin Highway pelo menos continha uma fábula consistente sobre o fim da infância e o despertar sexual. Em comparação, The Night is Short parece levar à risca as lições de uma de suas personagens:

Eu estava voando sem preocupações sobre Ponto-Cho.

Higuchi, o tengu estudante, me ensinou de um jeito que não poderia ter sido mais vago. Ele invadiu a casa de um dono de sebo que ele conhecia, saiu pelo varal e então apontou para o céu:A questão é viver sem deixar seus pés tocarem o chão. Aí sim você consegue voar.”

Eu achei que ele estava tirando sarro de mim até que eu imaginei um futuro completamente impraticável para mim: um dia, eu vou escavar aquela montanha lá na casa dos meus pais, encontrar petróleo, nadar na grana, me tornar um trilhardário, largar a universidade e viver uma vida feliz até eu morrer. Meu corpo rapidamente se tornou mais leve, e subitamente eu estava flutuando acima da varanda.

Morimi, como Higuchi, nos ensina apenas a flutuar. Não é o romance mais profundo que você lerá na vida. Mas quão surreal é Ponto-cho visto de cima!

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