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Mary Del Priore – finisgeekis https://www.finisgeekis.com O universo geek para além do óbvio Mon, 25 Feb 2019 16:54:32 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.7.11 https://i2.wp.com/www.finisgeekis.com/wp-content/uploads/2019/02/cropped-logo_square.jpg?fit=32%2C32&ssl=1 Mary Del Priore – finisgeekis https://www.finisgeekis.com 32 32 139639372 “Kuzu no Honkai” e a ditadura do orgasmo https://www.finisgeekis.com/2017/02/13/kuzu-no-honkai-e-a-ditadura-do-orgasmo/ https://www.finisgeekis.com/2017/02/13/kuzu-no-honkai-e-a-ditadura-do-orgasmo/#comments Mon, 13 Feb 2017 22:04:47 +0000 http://finisgeekis.com/?p=14966

Vez ou outra surge um anime que nos pega  de surpresa.

Para nós, blogueiros, o último sucesso com certeza foi Kuzu no Honkai. Meus colegas Vitor do Otaku Pós-Moderno e Fábio do Anime 21 me contaram que a série não só virou uma sensação, como fizeram suas resenhas quebrarem recordes de tráfego.

A atenção é merecida. A série pode parecer só mais um drama escolar, mas se afunda no tema que nunca falha em despertar interesse – ou polêmicas.

Sexo.

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Kuzu no Honkai, no entanto, não é apenas um pornô softcore. É uma das melhores explorações de sexualidade adolescente que o mundo do anime já trouxe. E que ressalta uma pergunta mais antiga que a modernidade:

O que, afinal, é esse “sexo” que tanto atormenta os jovens?

O sexo nosso de cada dia

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Parte do sucesso de Kuzu no Honkai está em como desafia nossas expectativas.

O anime acompanha Hanabi Yasuraoka e Mugi Awaya, dois colegas do ensino médio. Ambos têm paixonices platônicas por adultos que estão fora de seu alcance. Mugi ama Akane, sua professora de música. Hanabi ama Kanai, figura paterna presente desde a infância.

Impedidos de consumar seus desejos, eles decidem virar “namorados” de mentira, “amigos coloridos” que “usam” um ao outro como substitutos de seus amados. A regra é uma só: independente do que acontecer, eles nunca devem se apaixonar.

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É o roteiro de incontáveis comédias românticas batidas, mas que o anime da Lerche, baseado no mangá de Mengo Yokoyari, vira de ponta cabeça.

Para o desespero de fãs de romance – e alegria dos que detestam a fórmula – Kuzu no Honkai passa longa da história bonitinha de amigos que descobrem a felicidade do amor.

Como disse Jacob Chapman do ANN, este não é um anime sobre amar os outros, mas sobre odiar a si mesmo. Tal como Umibe no Onnanoko de Inio Asano, é sobre jovens que levam o sexo para um caminho auto-destrutivo – e tudo o que perdem no caminho.

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Kuzu no Honkai  não é um anime erótico mais do que um anime sobre o erotismo. É uma história sobre a iniciação sexual: a época tão esperada – e assustadora – das nossas vidas que a grande mídia insiste em retratar com a inocência de um comercial de margarina.

O anime não tem medo de “sujar as mãos” e mostrar episódios pelos quais todos passamos, mas raramente falamos. De uma garota lavando o sêmen que grudou na roupa às dores do vaginismo, ele é um dos retratos mais realistas de sexo que a censura R+ (não-hentai) pode oferecer.

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Mais importante, Kuzu no Honkai aborda as confusões e dilemas pelas quais adolescentes passam ao começarem a vida sexual. E os traumas que sofrem quando exigem de si mais do que seus corpos – e suas mentes – estão dispostos a dar.

A ditadura do orgasmo

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Dizer que adolescência tem tudo a ver com sexo é um dos clichés mais antigos que existem. Mesmo assim, há quem diga que a juventude moderna está bem distante do estereótipo “sexo, drogas e rock n’roll” popularizado por Skins.

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O seriado “Skins”

E não falo apenas da pesquisa que está circulando em grupos otakus, dizendo que os jovens de hoje fazem menos sexo do que nos anos 1960. Há quem diga que, de uma libertação, o sexo virou uma prisão.

A opinião é da historiadora Mary del Priore. Anos atrás, ela escreveu um livro argumentando que a Revolução Sexual quebrou alguns tabus, mas trouxe outros.

Muita coisa mudou, é verdade. A pílula anticoncepcional libertou as mulheres do fardo da gravidez. O sexo antes do casamento se tornou normal. Relações homossexuais passaram (lenta, mas gradualmente) a ser aceitas.

Os jovens dos anos 1960 viraram de ponta cabeça nossa relação com a sexualidade, e sua influência – e a felicidade das gerações futuras – não pode ser subestimada.

Porém, a Revolução Sexual trouxe também outro tipo de fruto. Do “amor livre”, veio a mentalidade que o amor “preso” deveria acabar. Monogamia virou coisa do “rebanho”, não de pessoas “interessantes”. De direito, sexo virou obrigação, e quem não transava – ou não transava o suficiente- passou a ser mal visto.

É a ditadura do orgasmo.

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Kuzu no Honkai mostra com todas as letras a angústia dessa geração. Hanabi e Mugi não se relacionam apenas para aliviar a dor de cotovelo. Eles sentem que precisam transar, mesmo que o sexo não lhes traga nada além de tristeza, dor e ódio próprio.

Nos quadros do anime, vemos preliminares, sexo, “primeiras vezes”. O que não vemos é amor, satisfação ou qualquer tipo de alívio. Não há sequer o prazer vazio que move adolescentes menos torturados de outras histórias.

Se para alguns o sexo é uma fuga ou um veículo de “empoderamento”, para os jovens de Kuzu no Honkai é uma droga: ele os destrói, mas sem ele não conseguem viver.

Da senpai que tirou sua virgindade, Mugi se recorda: “ela se sentia sempre solitária. Não era normal“. Hanabi chega na mesma conclusão por outro caminho. Após uma noite de sexo frustrado, sem conseguir extravasar o desejo, o terror a assombra: ficar sozinha é insuportável.

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As relações de Kuzu no Honkai são extremas, mas as angústias que elas retratam não.

Quem nunca beijou alguém por quem não se atraía para não virar motivo de chacota? Ou insistiu em um namoro insosso pelo medo de ficar sozinho? Ou transou com um (ou vários) desconhecido(s) para depois se sentir sujo e patético, um “pedaço de carne” humano?

Atire a primeira pedra quem nunca, em algum momento da vida, não sentiu, como Mugi, que estava deixando a adolescência escapar pelos dedos? 

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Como disse o filósofo Ryszard Legutko, nossa época criou a impressão de que precisamos estar estimulados 100% do tempo. O problema, como bem disse o Guiper do Otaku Pós-Moderno, é que uma vida de estímulos fáceis traz apenas o tédio.

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Estamos esclarecidos? Ou só confusos?

Mary del Priore publicou A História do Amor no Brasil em 2006. Curiosamente, mais ou menos na mesma época em que a saga Crepúsculo se tornava um fenômeno editorial.

timing não poderia ter sido mais perfeito. A quadrilogia da Stephanie Meyerde fato, é um protesto contra a “ditadura do orgasmo”. A série é uma apologia à castidade, mostrando a virtude de controlar os hormônios e amar do jeito “certo”. De preferência, depois do casamento.

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Teria a historiadora acertado? Dez anos depois, as coisas parecem diferentes. O sexo tem se tornado cada vez mais popular no gênero young adult. Séries como garota ama garoto se gabam de mostrar a sexualidade jovem como ela é. Mesmo o açucarado John Green, de A Culpa é das Estrelas, causou polêmica ao incluir uma cena de sexo oral em Quem é Você, Alasca? 

Claro, o mainstream é uma faca que corta dos dois lados. O interesse pode indicar que estamos encarando o sexo como algo mais normal. Ou, pelo contrário, que nos sentimos perdidos, buscando na arte alguma resposta para nossa confusão.

Como conclui Mary del Priore:

Há grande contraste entre o discurso sobre o amor e a realidade da vida dos amantes. O resultado? Escreve-se cada vez mais sobre a banalização da sexualidade e o desencantamento dos corações enquanto o amor mantém-se um sentimento sutil e importante que continua a fazer sonhar, e muito, muitos homens e mulheres.

O mesmo vale para o sexo. Lolita foi publicado em 1955. O Retrato do Artista Quando Jovemem 1916. O Despertar da Primavera (a peça, não o musical), em 1891(!)Se existe uma “ladra de adolescências” à solta, Mugi não foi sua primeira vítima – e não será a última.

É por isso, talvez, que histórias como Kuzu no Honkai continuarão a ser contadas.

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