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mahou shoujo – finisgeekis https://www.finisgeekis.com O universo geek para além do óbvio Sun, 24 Feb 2019 13:36:56 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.7.11 https://i2.wp.com/www.finisgeekis.com/wp-content/uploads/2019/02/cropped-logo_square.jpg?fit=32%2C32&ssl=1 mahou shoujo – finisgeekis https://www.finisgeekis.com 32 32 139639372 “Magical Girl”: quando garotas mágicas ganham o live-action https://www.finisgeekis.com/2018/05/14/magical-girl-quando-garotas-magicas-ganham-o-live-action/ https://www.finisgeekis.com/2018/05/14/magical-girl-quando-garotas-magicas-ganham-o-live-action/#respond Tue, 15 May 2018 00:34:09 +0000 http://www.finisgeekis.com/?p=20170  

Madoka foi inspirado em Fausto. Ozamu Tezuka adaptou Crime e Castigo aos mangás. Miyazaki citou Paul Valéry em Vidas ao Vento. Digimon fez homenagem a H.P. Lovecraft.

Referências a obras ocidentais não são raras nos animes e mangás. Mais incomum é topar com séries que façam o percurso oposto.

É o caso de Magical Girl, longa espanhol de Carlos Vermut, que trouxe o gênero mahou shoujo – em especial, sua encarnação dark –  às telas de cinema.

Em tempos em que o subgênero parece sucumbir ao seu próprio peso, é interessante descobrir o que foi feito das garotas mágicas transpostas ao realismo do live-action. 

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O filme foi lançado em 2014, mas você está perdoado se a estreia lhe passou batido. Magical Girl é um filme diminuto mesmo para os padrões europeus, de um gênero que fãs de anime não necessariamente acompanham. Que seu diretor tenha escolhido um thriller psicológico e não fantasia para contar sua história é prova da ousadia – e estranheza – do longa.

Sua trama acompanha Luís, pai de Alícia, uma garota com câncer terminal. Prestes a morrer, ela faz um último desejo: comprar um cosplay oficial de Magical Girl Yukiko, sua personagem favorita.

Tal como nos animes, porém, as coisas não são tão simples quanto parecem. Alícia não quer uma fantasia qualquer, mas uma versão especial feita sob medida para uma idol. Apenas uma unidade foi produzida, e o preço está acima do que Luís, professor desempregado, é capaz de pagar.

O destino o apresenta à Bárbara, mulher que sofre de problemas psiquiátricos. E um ato carnal precipitado (que leitores de Shuuzou Oshimi acharão dolorosamente familiar) o coloca em uma posição de chantageá-la.

Desesperado para satisfazer o último desejo de sua filha, Luís lhe exige dinheiro sob ameaça de destruir seu casamento. Bárbara, no entanto, possui seus próprios demônios, e na tentativa de pagar sua alforria se envolve em um espiral descendente de loucura, perversões e dívidas pessoais.

O tributo às mahou shoujo é evidente em sua bagagem visual, que pulula de referências a garotas mágicas com pinceladas de ironia e humor negro. A vodka que Bárbara bebe para tentar se suicidar com comprimidos chama-se Sailor Moon. E o vestido que Alícia tanto cobiça é um traje que fãs do gênero conhecem muito bem.

Não espere, porém, o sadismo visual de um  Mahou Shoujo Site. Magical Girl é um filme asséptico como um piso de hospital, contado por palavras não ditas, silêncios pronunciados e cenários claustrofóbicos de tão limpos.

Vermut é um expoente do cinema low cost, e é fascinante como suas táticas para enxugar a produção aproximam sua linguagem a dos animes – outra arte que aprendeu a fazer milagres com pouco recursos.

Suas tomadas estáticas, em especial, lembram não poucas cenas de anime, paralelo que seus diálogos prolongados salienta ainda mais.

  

Mesmo seu enredo parece despido de qualquer bagagem extra – incluindo a verossimilhança. O conflito que une a trama, e as ações desconcertantes de suas personagens, são implausíveis a ponto de parecerem parábolas.

Veja por exemplo Luís, que o filme nos introduz discutindo com um vendedor de sebo. A loja compra livros “por quilo”, sem discriminar o conteúdo. Luís se recusa a aceitar que Camilo José Cela, vencedor do Nobel, valha o mesmo que um manual de bricolagem. Por uma pilha de livros, recebe 5 euros. O cosplay de Magical Girl Yukiko custa 7 mil.

Luís volta ao sebo mais tarde no filme. Movido pelo desespero, vende toda a sua biblioteca. Os livros não valem nada, como nós sabemos muito bem.

Ele também sabe, mas sua questão é outra. Ex-professor de literatura, sua biblioteca é seu maior patrimônio. E ele não pode deixar a filha morrer sem saber que abriu mão do que lhe era mais valioso.

Ou veja então Alícia, que ao receber seu vestido, após tanto esforço, olha para a caixa desanimada. Procura atrás do sofá por um segundo presente. Finge um sorriso amarelo.

Seu pai não entende por que ela, que tanto quis o vestido, se recusa a vesti-lo. Mas nós, fãs de mahou shoujo, entendemos. O poder de uma garota mágica não vem de seu vestido, mas de seu báculo. E o báculo de Yukiko, recoberto de brilhantes, custa outros 20 mil euros.

O filme está cheio de referências a mitos modernos, de Alícia (Alice) e seu pai Luís (Lewis Carroll) a Oliver Zoco (Oz), que leva Bárbara a um mundo paralelo de onde não haverá retorno.

Vermut disse em entrevista que sua ideia era fazer um conto de fadas, com Alícia com princesa e Bárbara como madrasta. Tal como a rainha má de Branca de Neve, Bárbara também pede auxílio a um espelho mágico. Para sua infelicidade, ele se recusou a respondê-la.

Essas não são pessoas normais, mas almas torturadas com um vazio espiritual. É a angústia que encontramos nas páginas de Dostoiévski: na paranoia do narrador de Memórias do Subsolo ou no crime “justo” (e tragicamente executado) de Raskolnikov em Crime e Castigo.

Infelizmente, o estilo de Magical Girl às vezes atropela seu conteúdo. Veja Damián, ex-professor de Bárbara nos tempos de colégio, para quem ela pede ajuda quando tudo parece dar errado.

Nós sabemos que ele foi preso por protegê-la, que a estima tal qual uma filha e que morre de medo de revê-la. Como a personagem de Clint Eastwood em  Menina de Ouro, está disposto a fazer o sacrifício final se isso trouxer à protegida algum alívio.

Qual teria sido seu crime? O que Bárbara teve a ver com isso? Por que tem medo de revê-la, a ponto de implorar a sua agente penitenciária que o deixasse ficar preso mais um pouco?

São respostas que o filme não nos dá e logo entendemos que não nos dará. Em uma de suas primeiras cenas, nós o vemos completando um quebra-cabeça até se tocar de que falta uma peça. Não é o roteiro que está furado: é sua própria vida. Algumas pessoas são incompletas, e devemos aceitá-las assim.

É uma metáfora óbvia demais para seu próprio bem e importante demais para o que está em jogo.

Vermut citou Twin Peaks como um exemplo de série que se comunica bem sem precisar se explicar. É um paralelo pertinente, mas também infeliz. Sim, David Lynch também é um artista do silêncio. Mas há silêncios que dizem pouco. E aqueles que falam por si só.

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Club Silencio em Mulholland Drive , de David Lynch.

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Teriam as garotas mágicas “dark” ido longe demais? https://www.finisgeekis.com/2018/04/17/teriam-as-garotas-magicas-dark-ido-longe-demais/ https://www.finisgeekis.com/2018/04/17/teriam-as-garotas-magicas-dark-ido-longe-demais/#comments Tue, 17 Apr 2018 18:42:48 +0000 http://www.finisgeekis.com/?p=20110 Muito tempo atrás, os quadrinhos norte-americanos passaram por uma revolução. Inspiradas pelo sucesso de Watchmen e O Retorno do Cavaleiro das Trevas, editoras apostaram em versões “dark” de seus heróis favoritos.

A virada solidificou a chamada Era das Trevas dos comics. Entretanto, seus excessos levaram a algumas das histórias mais cínicas, apelativas e datadas do gênero.

As garotas mágicas dos animes fizeram um percurso similar, que teve seu auge em 2011 com Puella Magi Madoka Magica. E, tal como seus predecessores americanos, a magia parece  ter começado a falhar.

Mahou Shoujo Site, um dos mais chocantes exemplos de mahou shoujo “dark”, acaba de ganhar uma adaptação. E a recepção… não foi das melhores.

A obra, que já no primeiro episódio nos joga cenas de bullying, violência contra animais e garotas dançando entre espermatozoides, de fato nos obriga a fazer algumas perguntas.

Onde termina a “desconstrução” e começa o exploitation? Quando que o cinismo se torna excessivo? Até que ponto o comentário justifica o sadismo?

Para responder a essas questões, é preciso ir além da superfície.

O sofrimento que corrompe

É difícil assistir Mahou Shoujo Site e não se sentir repugnado pela violência gratuita. Quando uma cena de transformação faz uma garota chorar (literalmente) lágrimas de sangue sabemos que já não estamos mais no Kansas.

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Aqueles que aguentarem o bastante, porém, terão uma agradável surpresa. Por trás da nojeira e do mau-gosto, há muito a se gostar na história de Kentarou Satou.

Como eu argumentei em uma coluna passada, Mahou Shoujo Site é uma obra sobre agência. Garotas mágicas, Satou nos lembra, não são apenas super heroínas. Elas são verdadeiras deusas, com o poder de mudar a própria realidade.

Os familiares dessas histórias lutam para encontrar alguém digno de usá-lo. Usagi, Sakura e companhia são pessoa especiais, escolhidas a dedo porque têm a capacidade de fazer do mundo um lugar melhor.

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Mas e se tal poder caísse nas mãos de desajustados? E se Luna, Artemis ou Kero-chan escolhessem não garotas-modelo, mas o pior que a humanidade tem a oferecer?

Mahou Shoujo Site nos faz essa pergunta. Em capítulos que testam o estômago até dos mais fortes, vemos órfãs, vítimas de bullying e abuso sexual redistribuindo sofrimento com seus báculos mágicos. Contra aqueles que as fizeram sofrer, mas também (e sobretudo) contra si próprias.

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É uma mensagem tão poderosa quanto suas anti-heroínas, que se sobressaí mesmo na gorefest descompromissada de Satou.

O sofrimento, por si só, não molda caráter. Dar poder a vítimas pode ser o caminho mais rápido para formar novos vilões. Se o poder for absoluto, tanto pior o resultado.

Não é uma mensagem inventada por Mahou Shoujo Site. Pelo contrário, ela circula nos animes há anos, chocando-nos, surpreendendo-nos e fazendo-nos pensar muito antes de uma certa Homura aprender a voltar no tempo.

Muito antes de Madoka

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Uta Kata, lançado em 2004, é um desses precursores.

A série acompanha Ichika Tachibana, uma garota que leva uma vida normal até encontrar um espelho misterioso. No lugar de seu reflexo, ela encontra outra pessoa, com roupas e trejeitos que não parecem do nosso mundo.

Uta-Kata Anime Meninas

Manatsu, como ela se apresenta, lhe dá o poder de invocar gênios mágicos. O que se segue é um mahou shoujo que tica todos os requisitos que viemos a esperar do gênero.

Ao menos na superfície.

Na medida em que ela e seus amigos se colocam em apuros, Ichika usa seus novos dons para que tudo acabe bem. Cada episódio consiste numa “lição” sobre alguma virtude humana.

Para a surpresa de Ichika – e a nossa própria – estas lições são muito mais difíceis do que aparentam à primeira vista.

Não demora para que Ichika aprenda, tal como Peter Parker, que grandes poderes trazem grandes responsabilidades. Para começar porque os desafios que tem de enfrentar não são vilões cartunescos, mas a boa, velha e cruel natureza humana.

Uma de suas amigas foi estuprada por um familiar. Outra é filha de yakuza, com todas as consequências que isto acarreta. Em um dos primeiros episódios, Ichika encontra um stalker. E uma tentativa de trazer alívio a uma paciente psiquiátrica quase resulta na pior das tragédias.

Os problemas não param por aí. Ichika descobre que os gênios são uma via de mão dupla. Quanto mais usa seus poderes, mais é consumida por eles. Suas intervenções se tornam mais extremas, e ela começa a perder controle sobre sua própria vida.

Como outras garotas mágicas, Ichika descobre que seus desafios são parte de um teste. Uma prova, contudo, que não implica em salvar o mundo das forças do mal ou capturar cartas perdidas. Sua tarefa é muito mais fácil. Ela só precisa responder a uma pergunta:

Todo o sofrimento que ela própria causou com a ajuda de seus poderes. Todo o sofrimento que ela fracassou em aliviar. Tudo o que ela viu de podre, de revoltante ao longo dos doze episódios.

De quem é a culpa?

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Quem é o culpado pelo que há de errado no mundo? O indivíduo que executa as crueldades, ou a sociedade que o cria, incentiva e falha em corrigi-lo?

Ouvimos do vilão por trás dos gênios que a pergunta já foi feita uma vez, mas que o candidato escolheu a resposta ruim. Mas haveria de fato uma resposta ruim?

Pergunta errada. Haveria uma boa?

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Se você acha que o dilema é simples, Alien 9 existe para provar o contrário. Lançada em quatro OVAs em 2001, a série não é um mahou shoujo stritu sensu, mas nos ensina mais sobre garotas mágicas que muitos exemplos do gênero.

Ele nos conta de uma escola que sofre com ataques alienígenas. Para proteger os alunos da ameaça, um representante de cada turma é escolhido para integrar uma brigada especial.

Para combater monstros, porém, é preciso que nós também nos tornemos monstros. Assim, alunas da brigada são forçadas a “vestir” um alien simbionte, que se gruda à sua cabeça e se alimenta do seu suor.

Da forma mais nojenta possível

Yuri Otani, escolhida contra a vontade, reage como qualquer pré-adolescente reagiria. Seu desespero não vem nem tanto dos aliens, mas da completa indiferença daqueles ao redor.

Os alienígenas são perigosos, mas ninguém parece se importar com a ameaça. Quando o alarme a avisa de uma nova invasão, uma das colegas de Otani responde com um sorriso blasé: “pelo menos você matará aula!”

Otani não tem o menor talento para a luta e recorre a todo instante a seu simbionte. Suas companheiras de brigada a criticam por ser chorona. A professora que as gerencia insiste em dar a ela os trabalhos mais perigosos.

Em momento algum Otani (ou a gente) recebe qualquer explicação. Por que ensinar garotas a lutar, se os simbiontes parecem capazes de fazer tudo por conta própria? Por que insistir em recrutar meninas à força quando há várias que o fariam por conta própria? Por que aliens caem justamente naquela escola?

Alien 9 prende Otani em uma distopia kafkiana em que tudo dá errado à protagonista, mas ninguém parece entender (ou se importar) com seu sofrimento.  Como Gregor Samsa transformado em uma barata, a garota vive um terror que parece só existir na sua cabeça.

Isso fica mais claro quando a série avança e o realismo é tacado pela janela. O absurdo cresce a tal ponto que Otani – e novamente a gente, enxergando o mundo pelos seus olhos – se torna incapaz de separar pesadelo e realidade.

Para alguns, a série é uma alegoria sobre o abuso sexual e a pressão que as vítimas sofrem para ficar caladas. De fato, é difícil assistir o anime sem pensar no gaslighting, fenômeno em que uma pessoa, por pressão externa, chega a duvidar das próprias memórias.

Para outros, é uma crítica às nossas próprias relações sociais, tão engessadas por protocolos, metas e deveres que ficamos cegos ao seu conteúdo humano.

Seja como for, é possível ver uma ligação direta entre o anime e a moda das garotas mágicas dark. Se mahou shoujo são fábulas de empoderamento, Alien 9, tal como suas versões sombrias, são uma viagem claustrofóbica de impotência.

Mas seria isso um mal? Ou uma faceta inescapável da vida?

As coisas ficam mais confusas quando descobrimos que os próprios adultos são aliens em disfarce.

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Durante um momento de pânico, uma Otani chorosa descobre que todos na sua escola se transformaram em alienígenas. Eles riem da sua desgraça, cantando alegremente:

Todo mundo, todo mundo é um alienígena

Todo mundo virará alienígena

Todo mundo vai virar um

Todas as crianças vão se graduar

Seus corpos vão mudar

Elas se tornarão adultas

E todo mundo é um alienígena

Qual seria a moral da história? Estamos todos condenados a nos transformar em monstros? A realidade é um pesadelo que aprendemos a tolerar? A puberdade é assustadora?

Talvez a moral seja justamente não ter uma moral. E a decisão de Alien 9 de encerrar sua história pela metade, adaptando apenas parte do mangá original, seja um testemunho em favor disso.

O choro de Otani, que ocupa quase todo o tempo de exibição de Alien 9, não é lá tão diferente do de Aya Asagiri, protagonista de Mahou Shoujo Site. Como eu já disse em outra ocasião, o que mais assusta não é a violência. É a arbitrariedade.

Conclusão

Yuuki Yuuna, um dos clones mais famosos de Madoka, termina com uma apresentação de teatro feita por suas personagens. “O mundo é cheio de miséria e desespero” diz a bruxa má. Cedo ou tarde, você terá de aceitar isso.

“Não” diz a heroína. É tudo questão de coragem. E heroínas nunca perdem, porque sua força de vontade é infinita.

É um final digno da série, que leva suas garotas a superar até mesmo a morte, num clímax que mais tem de Sailor Moon que do mahou shoujo dark que diz ser. Com doses suficientes de girl power, não há nada que não possa ser vencido. Nem mesmo a realidade.

Uta Kata e Alien 9, cada qual à sua maneira, provam que as coisas não são tão simples. Primeiro porque a realidade não é um quadro em branco à espera das nossas pinceladas.

É, sim, uma experiência angustiante, alienígena e sem propósito em que as coisas nunca são o que parecem. E nossas tentativas de deixar nossa marca muitas vezes nos transformam nos próprios monstros contra que lutamos.

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Segundo porque não depende só da gente. E os “outros”, longe de serem o clube serelepe de amigas da Yuuna, são pessoas com suas próprias mentes, seus próprios objetivos, seu próprio certo e errado.

Como Ichika, que termina seu anime literalmente crucificada, estamos entre a cruz e a espada da ambição individual e da pressão coletiva.

Quem deve prevalecer? Nossos desejos particulares ou a vontade conjunta (e conflitante) de todos à nossa volta?

As garotas torturadas de Mahou Shoujo Site escolheram a primeira opção. Madoka Kaname, como a Esmeralda de Rayearth, optaram pela segunda.

No meio desses extremos estão as nuances de um dos gêneros mais ricos que o anime nos trouxe. E uma pergunta tão simples, mas ao mesmo tempo tão séria, que nunca acabaremos de responder.

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O que acontece quando garotas mágicas envelhecem? https://www.finisgeekis.com/2018/03/06/o-que-acontece-quando-garotas-magicas-envelhecem/ https://www.finisgeekis.com/2018/03/06/o-que-acontece-quando-garotas-magicas-envelhecem/#comments Tue, 06 Mar 2018 21:01:06 +0000 http://www.finisgeekis.com/?p=20014 Cardcaptor Sakura está de volta após vinte anos. Aos fãs, o momento é de celebração. Contudo, embora a série esteja longe de decepcionar, nem todo mundo a recebeu de braços abertos.

Isso, por si só, não é uma surpresa. De Sailor Moon Crystal a Dragon Ball Super e Digimon Trirevivals, reboots remakes de séries clássicas têm enfrentado sua dose de desafetos.

Clear Card, no entanto, parece ter motivado críticas de outra natureza. Para alguns, a série cumpre seus objetivos bem demais, evocando uma utopia infantil de que seus fãs originais (hoje adultos) se sentem distante.

Sakura pode estar na sexta série, apenas um ano mais velha que a heroína cujas aventuras assistíamos em TVs de tubo em 4:3. Para os espectadores, no entanto, foram vinte longos que não voltarão – nem trarão de volta a inocência que perdemos pelo caminho.

Seriam as garotas mágicas incompatíveis com o mundo adulto? Em uma era pós-Madoka, há espaço para collants e varinhas em uma rotina com filhos e imposto a declarar?

Para a alegria dos fãs de Sakura — e também de seus críticos desiludidos — eles não foram os primeiros a fazer essas perguntas.

Quando as garotas mágicas envelhecem

Magic (old) Girl Fairytale Kururu nos mostra, de uma maneira descompromissada, o que seria da Sakura se envelhecesse como nós.

Escrito por Akira Kojima, o one-shot nos apresenta a uma garota que aceitou o manto de guerreira amor e da justiça… e perdeu o momento de parar.

Aos dez anos, Kururu foi escolhida por Cosmos, o espírito celestial, para proteger a terra dos espíritos noturnos. Vinte anos depois, Kururu se transformou em uma balzaquiana; Cosmos, em um familiar senil; os espíritos noturnos, em um trabalho menial.

Presa às obrigações de heroína, a jovem mulher vive uma vida solitária, trocando o dia pela noite e dividindo apartamento com uma amiga solteirona.

O one-shot de Kojima é um retrato bem-humorado do nonsense intrínseco às garotas mágicas, imperceptível a meninas de dez anos, mas inevitável a adultos.

Forçada a dormir durante o dia para se recuperar das “batalhas”, Kururu adota uma rotina de NEET. De fato, não é difícil interpretar o mangá como uma alfinetada contra os próprios otakus, felizes em importar à maturidade um ideal juvenil de sucesso. Em alguns casos, em detrimento daquilo que a idade traz de bom, como a independência financeira e a vida sexual.

É um conflito parecido ao explorado em Complex Age, saga de uma cosplayer  de 26 anos obcecada em representar uma mahou shoujo.

Embora não seja “mágica” em nenhum critério do termo, sua protagonista busca no “2D” um ideal de perfeição que a vida normal não lhe traz.

Complex Age: A Hobby Manga Set in Reality

Para Nagisa, protagonista do mangá, a mahou shoujo é uma máscara que pode – e, segundo alguns, deve – remover. No entanto, que Kururu, a garota mágica de Kojima, decida insistir na “profissão”, tirando um prazer dissimulado de sua própria sina, é sinal de que a escolha é mais difícil do que parece.

Se Kojima tivesse investido em sua fábula para além de um (curtíssimo) one-shot, suas consequências morais poderiam receber a atenção que mereciam.

Felizmente, o báculo foi tomado por outros criadores. E o resultado é uma das obras mais divertidas, tocantes e inesperadas a agraciar o gênero.

Bewitched Agnes

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Okusama wa Mahou Shoujo (“Minha esposa é uma garota mágica”) é a resposta mais famosa à pergunta que abre esse post.

Seu título em inglês, Bewitched Agnes, é uma referência à inspiração de todas as mahou shoujo: o seriado A Feiticeira, transmitido nos Estados Unidos de 1964 a 1972.

Tal como na série que o inspirou, Bewitched Agnes explora as dificuldades em conciliar uma vida conjugal com a bênção duvidosa de poderes mágicos.

Que o anime tome o “partido” de uma adulta é evidente na própria heroína. Agnes é uma referência a Agnes Moorehead (1900-1974), atriz que interpretou não a feiticeira Samantha, mas sua mãe, Endora, no clássico da TV americana.

Okusama wa Mahou Shoujo traz esses conflitos à fórmula das mahou shoujo que tão bem conhecemos.

Agnes é uma garota mágica de 26 anos, casada com um famoso escritor. Como parte do preço para obter seus poderes, a heroína foi proibida de beijar outras pessoas. Com o tempo, a condição força os limites de seu casamento e os impele a se separar.

Sua vida, porém, é virada de ponta cabeça quando um jovem rapaz se hospeda na pensão em que trabalha. Agnes sente seus desejos se reacenderem – e, com eles, as angústias de uma vida que lhe foi proibida.

Seus problemas não param por aí. Seus “chefes” ordenam que se aposente e enviam uma nova heroína para usurpar seu manto: Sayaka Kunerai, AKA “Cruje”, que divide a aparência, o gênio e o próprio nome com a melhor amiga de Madoka.

Bewitched Agnes possui todos os elementos de uma comédia. Contrariando as expectativas, a série na verdade é um melodrama, que uma trilha de Kenji Kondo (compositor da série Zelda) só torna mais comovente.

Sua trama, logo percebemos, é uma exploração das angústias de uma mulher que entende que a juventude – e suas infinitas possibilidades – não estarão ali para sempre.

O próprio fanservice, que em outras séries pareceria arbitrário, age como metáfora do redescobrimento de sua própria sexualidade e de suas inseguranças para com uma rival com a metade de seus anos.

Seu conflito evoca Kururu do mangá de Kojima, que se deixou virar uma virgem de 30 anos por não ter tempo para namorar. Se a heroína do one-shot abraçou o celibato de seus sonhos juvenis, para Agnes essa infantilização é impossível. Não apenas sua mente, mas também seu corpo anseia pela maturidade.

A genialidade do anime não está (apenas) em trazer isso à tona. Com uma narrativa despretensiosa e uma paleta de cores brilhante, Bewitched Agnes escancara a essência das garotas mágicas de uma forma que nem Madoka fez igual.

O poder de mudar o mundo

As garotas mágicas do anime não são as guerreiras com que estamos acostumados.

O conselho que as comanda é menos um Reino da Lua que uma versão cor-de-rosa de Cidade Sombria, resetando periodicamente a realidade por motivos que nunca ficam claros.

Suas mahou shoujo são verdadeiras deusas, no estilo de Madoka ou Haruhi Suzumiya, com o poder de moldar tudo aquilo que existe aos seus desejos. Wonderland, onde se passa o anime, não é uma cidade real, mas uma criação da própria Agnes, herdada de sua mãe e de todas as garotas mágicas que vieram antes.

Toda mahou shoujo que recebe o manto tem o dever de destruir a cidade de sua predecessora. E criar uma nova Terra do Nunca afinada à sua imaginação.

Não é difícil ver no enredo uma metáfora às próprias garotas mágicas – e à mídia do anime como um todo. Tal como estas séries atendem nossa demanda por heroínas inspiradoras, também seu mundo fictício se molda às demandas destas heroínas, dobrando-se para ajudá-las a brilhar.

Em alguns momentos, a alfinetada chega a ser cáustica. Quando Cruje sente vontade de ir ao um parque de diversões, ela resolve criar um do zero. O episódio lembra a conveniência de tantos animes, em que uma roda gigante – ou uma praia, um vilão, um rapaz bonito, uma vitória – estão sempre a uma esquina de distância.

O Silver Millenium funciona porque é um grande Show de Truman.

O problema é que as demandas de uma jovem não são as mesmos de uma mulher adulta. E a diferença entre uma prisão e uma utopia, muitas vezes, está em quem segura as chaves.

Agnes hesita em passar o bastão porque não quer que seu mundo, em que vive e que aprendeu a amar, desapareça. Cruje, sua sucessora, tem pouca paciência para isto. Os jovens não são obrigados a sofrer sob as tradições adultas. Eles têm o poder – e o dever – de batalhar por um futuro diferente.

Mahou shoujo são muitas vezes histórias de formação. Por meio da linguagem didática de feitiços, transformações e familiares, suas heroínas crescem, descobrem a si mesmas, tornam-se independentes e encontram uma voz própria.

Qual é o fim desse processo? Qual é o momento em que damos a volta e descobrimos, como numa velha canção do Jacques Brel, que nos tornamos os adultos opressores que tanto combatíamos?

Bewitched Agnes nos traz esse momento. A virada, para suas garotas mágicas, não é uma luta abstrata contra o establishment, mas uma realização pessoal.

Todos somos iconoclastas até o dia em que criamos algo de que nos orgulhamos. Quando tudo o que temos é o futuro, não pensamos nada de apagar o mundo com um estalo. A partir do momento em que deixamos algo para trás – uma obra, um ideal, um direito, um outro ser humano – podemos enfim abandonar o báculo.

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