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Disney – finisgeekis https://www.finisgeekis.com O universo geek para além do óbvio Mon, 25 Feb 2019 17:46:52 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.7.11 https://i2.wp.com/www.finisgeekis.com/wp-content/uploads/2019/02/cropped-logo_square.jpg?fit=32%2C32&ssl=1 Disney – finisgeekis https://www.finisgeekis.com 32 32 139639372 Os animes são uma mídia para adultos? (Parte 2) https://www.finisgeekis.com/2016/07/13/os-animes-sao-uma-midia-para-adultos-parte-2/ https://www.finisgeekis.com/2016/07/13/os-animes-sao-uma-midia-para-adultos-parte-2/#comments Wed, 13 Jul 2016 18:12:48 +0000 http://finisgeekis.com/?p=8016

Na semana passada, eu me reuni ao Fábio Godoy do Anime 21, Diego Gonçalves do É Só Um Desenho e Vitor Seta do Otaku Pós-Moderno para responder a uma pergunta que todos já ouvimos diversas vezes.

Os animes que tanto curtimos são, de fato, um entretenimento para adultos?

Nessa semana, Cat Ulthar do Dissidência Pop e Kouichi Sakakibara do Animes Tebane se uniram a nós para refletir sobre a reputação dos desenhos japoneses, ora tidos como “coisa de criança”, ora como “diversão madura”.

E o que, em um caso ou no outro, estaria por trás dessa “maturidade”.

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Vinicius: Na semana passada, o Vitor mencionou os desenhos da Pixar como exemplo de um cinema infanto-juvenil com grande apelo para adultos.

Fico feliz que o estúdio tenha sido mencionado, pois ele é a primeira coisa que vem à minha mente quando penso em “animação” e “públicos-alvo” fora de um contexto japonês.

De fato, as animações da Pixar (e da Disney, antes dela) são verdadeiros primores, prova de que é possível fazer arte para todos os públicos. O próprio Justin Sevakis do Anime News Network as compara, com razão, às obras do Miyazaki e do Mamoru Hosoda.

Eu, mesmo, não tenho como discordar. Com o risco de perder alguns leitores, preciso confessar que, na minha opinião, A Bela Adormecida (1959) é a melhor animação já feita, superando qualquer coisa já produzida no Japão ou em qualquer outro lugar do mundo.

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Dito isso, parece-me sim que essa filosofia de animação, em seu esforço para não impor barreiras à compreensão, é frequentemente menosprezada.

Ou, para usar as palavras do Diego, ser “para adultos” tornou-se, de fato, um “atestado de qualidade” para uma parte do público (embora este “atestado” seja exigido de forma bem seletiva).

Isso com certeza tem menos a ver com a animação em si do que com a subcultura ocidental que veio a se identificar com os animes.

Talvez isto seja sinal de uma nova “contracultura” do século XXI. Talvez seja um mecanismo de defesa de pessoas que passaram a vida ridicularizadas por “gostar de desenhos”. Talvez, tão simplesmente, seja um produto da nostalgia pelos anos 1990, que leva jovens adultos a considerar o entretenimento padrão “da sua época” como o supra-sumo da arte.

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O que eu acho significativo é que essa não é uma opinião restrita a um círculo de fãs, mas disseminada entre os próprios críticos. Um dos maiores exemplos de memória recente foi a repercussão do Oscar de 2015, quando Kaguya Hime não faturou a estatueta de Melhor Animação.

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O grande vencedor

Um site citou a vitória de Big Hero 6 como “prova de que os votantes do Oscar não sabem nada sobre animação”. Outro, que o Oscar “não faz a menor ideia do que fazer com filmes excepcionais”. Um terceiro disse que, se A Viagem de Chihiro fosse apresentada hoje, provavelmente perderia para Lilo & Stitch.

Não quero pôr a mão no fogo para defender o Oscar. Suas políticas internas são, realmente, detestáveis. Porém, me parece claro que os votantes da academia adotam a “acessibilidade” como um critério essencial. Por mais que alguns tenham criticado o prêmio por levar em consideração a recepção infantil, parece haver um consenso de que uma animação que atinja a todos é preferível a um trabalho de nicho.

O que me leva a um outro ponto. Muitos dos animes considerados “adultos” não são apenas sofisticados. Eles requerem, também, uma bagagem cultural muito específica.

É o caso de Mawaru Penguindrum com o atentado ao metrô de tóquio em 1995 , de Joker Game com a Segunda Guerra Sino-Japonesa e de Showa Genroku Rakugo Shinjuu… bem, do começo ao fim.

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Isso me lembra de uma entrevista antiga de Mamoru Oshii. Nela, o diretor disse que animes são uma parte da cultura japonesa, e que seus temas jamais serão apreciados por ocidentais da forma como o são em seu país de origem. Não existe uma “cultura global”. Um japonês, diz ele, jamais entenderia a Guerra do Vietnã, e seria ingenuidade acreditar que a recíproca seja verdadeira.

Como vocês vêem a indústria atual nesse sentido? O próprio Justin Sevakis do ANN disse, ano passado, que a popularidade de animes no Ocidente (com a vinda ao Netflix e ao Hulu) estava fazendo diretores priorizarem gêneros “fáceis de se exportar”.

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Um exemplo entre tantos

Vocês acham que esse pode o futuro do anime (ao menos no curto prazo)? Ou existem sinais de que a indústria esteja adotando um caminho contrário?

Kouichi: A própria existência dos termos demográficos “Seinen” e “Josei” já deixa clara a existência de uma parcela da indústria da animação que quer atingir o público adulto. Infelizmente para o desenvolvimento dessa discussão, acho que ninguém vai ter a coragem de se opor.

Obras com um público bem restrito existem há muito tempo, mas de fato acredito que só recentemente elas começaram a ganhar um espaço maior durante as ditas “temporadas”.

Recentemente, escrevi um artigo sobre Ergo Proxy, que em meio a toda a “dissecação” do tema, eu me vi pesquisando latim e referências filosóficas do século XVIII e XIX para simplesmente começar a entender uma pontinha do enredo proposto. Dizendo isso já podemos imaginar o quão complexa é a obra, e como é restrito seu público alvo e consecutivo a isso, o quão afetado são seus lucros.

O que me chama atenção em todo caso, não é a existência ou não de obras focadas no público adulto nas últimas temporadas, ou existência real de um grande público adulto interessando em animação, mas sim, até onde animações adultas conseguem atrair adultos?

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Não é por nada não, mas no meio “otaku” em que convivo, eu costumo ver muitos adultos mais interessados em Moe e Ecchi, que em obras mais complexas como o já citado Joker Game ou até mesmo Young Black Jack, do fim de 2015.

Dito isso, me surge outra questão: se adultos vão se interessar por obras infantis/adolescentes, até onde é lucrativo produzir obras restritas para o público adulto, que não se mostra muito seletivo?

Diego: Eu tenho um ou dois comentários a fazer nessas últimas considerações do Vinicius, mas antes eu queria comentar algo que o Fábio falou no seu primeiro comentário: o que surgiu primeiro, animes para adultos ou  adultos vendo animes?

Recentemente, eu terminei de ler o livro Quadrinhos – História Moderna de uma Arte Global, que faz uma espécie de panorama dos principais movimentos e artistas relacionados aos quadrinhos da década de 60 até a atualidade.

Uma coisa interessante nele é que se você olhar bem a partir das décadas de 60 e 70 você tem quase que um movimento mundial de surgimento de quadrinhos “adultos” (é quando temos, por exemplo, o underground americano, com quadrinhos que retratam sexo, consumo de drogas e por ai vai)

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E meio que só pra “jogar” mais uma referência, isso me lembra também algo que Paul Gravett comenta no seu livro Mangá: Como o Japão Reinventou os Quadrinhos Ele fala do movimento Gekigá e de como ele veio após algumas gerações que já tinham crescido lendo mangá desde pequenos. Havia, então, uma demanda por esse produto por adultos que não queriam abandonar o hábito de leitura, mas também não queriam os quadrinhos infantis de antes.

Então eu acredito que a resposta a essa pergunta, Fábio, é uma espécie de meio termo. Você tem toda uma geração (ou mais) que de certa forma foi “acostumada” com a mídia, e que conforme foi crescendo não quis “desapegar”, e a isso você junta uma série de artistas que querem expandir os limites da mídia, e bom, aqui estamos agora.

Agora, Vinicius, sobre essa questão de o anime exigir uma certa bagagem, eu diria que isso depende muito de anime a anime, mesmo dentre as obras adultas.

Por exemplo, Master Keaton, anime de 39 episódios de 1998, é um anime episódico que segue o dia a dia de um investigador de seguros e ex-arqueólogo.

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É uma obra criada como direcionada a adultos na faixa dos 30, e sua estrutura lembra muito série americanas como CSI ou alguma outra de investigação, no sentido de ser algo mais formulístico.

Enfim, é um anime que facilmente qualquer leitor ocidental consegue entender sem problemas. Outro anime do tipo seria Galery Fake, sobre uma espécie de anti-herói que trabalha no submundo das venda de arte de forma ilegal. O anime é de 2003 (acredito) e é super acessível.

E eu argumentaria ainda que o próprio Joker Game é sim bastante acessível, porque embora o leitor ocidental não tenha normalmente essa bagagem cultural do lado oriental da segunda guerra, o próprio anime não trabalha realmente muito isso: é apenas “cenário” ali, e fora isso ele é uma história de espiões bastante “comum”, ou ao menos assim me parece.

Isso dito, de fato tem sim animes que exigem algum conhecimento, e que concordaria que as experiências de um espectador oriental e um ocidental seriam completamente diferentes. Exemplos seriam animes que usam pesadamente do folclore e do simbolismo próprio ao Japão, como Uchouten Kazoku, Hotarubi no Mori e, Kyousougiga e outros nessa linha.

houtarubi no mori

Cat: Essa é uma pergunta que, para um melhor entendimento, deve sair apenas do nicho dos animes japoneses, e abordar todo o trabalho de animação que exista, seja de qual país for, para depois adentrar em algo mais específico, como o Anime japonês.

Penso que a razão das animações serem prontamente associadas a um público infantil seja a influência, por vezes perversa, da televisão.

Geralmente animações, sejam ocidentais ou animes, são exibidos em canais ou programas infantis. Todo mundo deve lembrar dos velhos tempos da TV brasileira onde não era difícil poder assistir um anime ou outro, desde Cavaleiros do Zodíaco a Hunter x Hunter. Isso seria culpa do senso comum.

Em uma análise um pouco mais aprofundada do senso comum, verifica-se que quando um desenho possui uma temática mais madura ele seria a exceção, uma deturpação do sentido clássico da animação, que é entreter as crianças, como no caso de South Park e afins. Portanto, o desenho “adulto” seria o estranho no ninho.

Entretanto, sabe-se que as coisas não são bem assim. A animação surgiu como mais uma forma de expressão da arte cinematográfica. Como existem filmes que são infantis, outros não, assim ocorre com as animações, sejam ocidentais ou animes. Tudo é a questão da vontade criativa do seu criador. Isso ocorre em qualquer tipo de expressão artística, como a literatura, a música, as artes plásticas, há material voltado para todas as idades.

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Há animações para todas as idades, para crianças, para jovens, para adultos. No Japão há canais para cada demografia especializada. Como poderia ser classificado como infantil obras como Akira, Ghost in The Shell, Serial Experiments Lain, entre outros? Isso falando de animações japonesas, pois no ocidente não é diferente, como a clássica animação francesa surrealista Planeta Fantástico

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Claro que há obras que transitam entre várias demografias, ou melhor dizendo, muitos diretores, roteiristas e produtores inserem subtextos ou metalinguagem em suas obras no sentido de mascarar certas temáticas que não seriam apropriadas abordar para o público alvo de maneira direta.

Por exemplo, Digimom Tamers, dirigido por Chiaki Konaka, que produz muito material de horror lovecraftiano, que não é nada infantil, mas conseguiu inserir essa temática em uma obra voltada para o público infantil, de uma maneira a não levantar qualquer tipo de controvérsia. Mas um adulto, cito como exemplo eu, ao ver a obra depois de tantos anos verifica que ela mostra nas entrelinhas muito mais que uma criança consegue perceber conscientemente.

Outro exemplo clássico é Sakura Card Captors, somente quando adulto, ou pelo menos mais maduro que fui perceber a tensão homossexual que existe entre os personagens da série (Sakura X Tomoyo e Yukito X Toya). Quando eu era criança, esse tipo de material passava despercebido, assim como ocorre na maioria dos casos. Assistir uma obra na infância e depois assistir na idade adulta, são experiências totalmente diferentes.

Nesse tema eu também poderia citar uma série de postagens que fiz sobre a influência do misticismo gnóstico nos animes. O gnosticismo é uma corrente filosófico/religiosa antiquíssima e nada infantil, entretanto alguns de seus elementos e ensinamentos podem ser observados nas mais diversas obras, como Neon Genesis Evangelion, voltada para o público infanto-juvenil, mesmo possuindo uma complexidade ímpar.

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Assim, digo com certeza, que animes não são uma mídia para adultos, nem para crianças, tampouco para velhos, mas sim uma forma de entretenimento voltada para qualquer público dependendo da vontade do seu criador.

Muitas vezes uma obra voltada para crianças pode ser permeada de elementos adultos, colocados de forma não intencional ou, como ocorre muitas vezes, de forma intencional. Os animes são como qualquer outra forma de entretenimento, podem se encaixar em qualquer nicho ou faixa etária, basta procurar o que te interessa.

Fábio:  Eu me sinto plenamente representado pela resposta do Gato agora, era isso o que eu tentava dizer – o que não quer dizer que essa seja “a verdade”.

A verdade é que, na verdade, nem tentamos responder muita coisa, muito menos encontrar alguma verdade, não é? Com mais ou menos fundamentos cada um aqui deu sua opinião. E tudo bem. Mas no fundo falamos cada um de coisas diferentes e por isso as aparentes discordâncias, suponho.

Anime é pra adulto. Anime é pra criança. Anime é pra todo mundo e não é para ninguém em particular. Cada anime tem seu público-alvo. Sem repetir demais o Gato, alguns são mais infantis, outros são mais adultos, outros possuem temas adultos contados de forma que crianças consigam absorver – não necessariamente entender.

Ao mesmo tempo, a maioria dos animes é produzido para o público jovem adulto, mas são razoavelmente infantis ou infantilizados. Animes infantis e infanto-juvenis são produzidos em menor número absoluto mas com outra lógica de negócio, e costumam ter mais episódios e temporadas – e muito adulto assiste esses animes também. E existe uma minoria de animes realmente adultos.

Historicamente, a animação surgiu como uma técnica cinematográfica, e como toda arte, não era produzida para alguém em particular mas por ser produzida por adultos tendia a ser ela própria adulta ou puramente experimental.

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A Culpa é do Samba, curta da Disney de 1948, originalmente concebido para a participação de Carmen Miranda.

Com Disney nos EUA e com Tezuka no Japão (esse muito influenciado por aquele) a arte da animação se voltou fortemente para as crianças, e o sucesso desses dois artistas e empreendedores provavelmente é responsável pela imagem da animação como arte para crianças até hoje – mesmo que o próprio Tezuka tenha chegado a produzir também para adultos.

Sobre a Disney eu não sei, e por saber tão pouco prefiro apostar que ele também nalgum momento tentou encantar adultos, não apenas crianças – mas sua empresa, hoje, certamente investe em obras para toda família, algumas com as tais mensagens adultas mastigadas para crianças consumirem.

E não é como se em qualquer momento histórico tenha deixado de existir artistas que produzissem para adultos.

São quatro pontos de vista diferentes: o vocacional, o comercial, o artístico e o histórico. Cada um falou um pouco sobre alguns deles. Todos são válidos, nenhum é conclusivo. Se a pergunta for “Anime é para adultos?” no sentido de potencial, a resposta é sempre sim, pode ser. Se for no sentido determinístico, então a resposta é sempre não – anime não é só para adultos, afinal.

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‘Star Wars’, o universo expandido e o futuro do mundo nerd https://www.finisgeekis.com/2015/10/26/star-wars-o-universo-expandido-e-o-futuro-do-mundo-nerd/ https://www.finisgeekis.com/2015/10/26/star-wars-o-universo-expandido-e-o-futuro-do-mundo-nerd/#comments Mon, 26 Oct 2015 20:37:35 +0000 http://finisgeekis.com/?p=794 Lançamentos são mágicos. Em especial os de uma das franquias mais amadas de todos os tempos, como é o caso de Star Wars. Eles transformam o maior dos rabugentos em um fanboy de carteirinha e nos fazem enxergar o lado bom das coisas.

Não posso dizer que o Despertar da Força não tenha me provocado um efeito similar. Entretanto, agora que os rumores já deram lugar aos trailers e já estamos todos lutando por espaço na pré-estreia, não consigo deixar de pensar em algo que causou certo frisson ano passado.

O que será do universo de Star Wars, que certos fãs levaram anos a compreender, agora que sua linha do tempo foi “zerada” e sua galáxia se torno um quadro em branco?

Uma nova esperança

Para quem não se lembra, eis o resumo da ópera: após comprar a Lucasfilm, a Disney anunciou que o universo expandido de Star Wars seria considerado não-canônico – isto é, não mais faria parte da continuidade ou lore oficiais. Suas obras existentes seriam mantidas sob o selo Star Wars Legendsmas ele estaria, para todos os fins, abandonado.

Mais importante, todas as novas produções feitas à propriedade intelectual daqui para frente seriam consideradas canônicas.  Se antigamente os filmes de George Lucas ocupavam um patamar mais alto na hierarquia de “verdade” da franquia, agora filmes, spin-offs e standalones estarão no mesmo patamar. Para todos os fins, a Disney parece querer transformar Star Wars em um multiverso cinemático, da maneira como fez com a Marvel e tantas outras propriedades intelectuais.

Talvez levemos algum tempo para entender toda a dimensão da mudança, mas alguns efeitos podem ser vistos desde já. A LucasArts foi fechada, e a ordem do dia foi produzir menos games, de melhor qualidade. Para a EA, incumbida das honras, isso quis dizer um reboot de Star Wars: Battlefront.

Uma nova série, Star Wars: Anthology, pretende lançar longas standalones nos intervalos dos filmes “titulares” da série. Em outras palavras, poderemos esperar um novo Star Wars a cada ano, um ritmo para todos os fins alucinante. E, segundo Pablo Hidalgo, membro da Lucasfilm e editor da Complete Star Wars Encyclopedia, as decisões criativas tornaram-se muito mais “horizontais”, sem a obrigatória deferência ao mestre Lucas.

Para marcar a mudança, veteranos do império de Lucas e novos nomes se juntaram para um vídeo de despedida, em que expunham seu amor pelo universo expandido:

Mudá-lo para salvá-lo

Se essa novidade é boa ou ruim é uma discussão ferrenha, como não podia deixar de ser a uma franquia lendária de mais de 30 anos. Eu mesmo, quando do anúncio da compra pela Disney, disse que tirar Star Wars das mãos de George Lucas era a melhor coisa que poderiam fazer à propriedade (embora não estivesse pensando exatamente nisso).

Eu não fui o único a brindar a mudança. Lee Hutchinson do Ars Technica disse que o universo expandido era um câncer, uma massa embolorada que crescia para todos os lados, repleta de “atrocidades literárias ilegíveis”. Achar trabalhos que prestem na massa de produções de qualidade duvidosa seria equivalente a encontrar as joias da Coroa em um mercado de pulgas.

Se Lucas tivesse vendido a marca para a BBC, isso não seria um problema

Se Lucas tivesse vendido a marca para a BBC, isso não seria um problema

Há, obviamente, muito no universo expandido que marcou época. Shadows of the Empire e a trilogia Thrawn, os quadrinhos Tales of the Jedi Legacy, os games X-Wing, Dark Forces/Jedi Knight e Knights of the Old Republic. No entanto, é difícil negar que a maior parte de suas obras não traz nenhuma honra ao logo na capa.

Kathleen Kennedy, presidente da Lucasfilm, tem um argumento mais pragmático: os cineastas precisarão estar livres para criar, e não presos a dezenas de milhares de obras obscuras e por vezes contraditórias. Se fôssemos esperar que cada diretor decorasse a Wookiepedia e produzisse um longa inédito respeitando o cânone, nunca mais teríamos filmes de Star Wars.

Há quem diga que essa complexidade também afasta novos públicos, preocupação que a Disney mostrou ser seu objetivo número 1. Sob sua batuta, o não menos confuso, contraditório e artisticamente inconsistente universo Marvel se tornou uma potência capaz de duelar (e vencer) qualquer líder de bilheteria. Star Wars com certeza irá além. Ao menos um analista já disse esperar que O Despertar da Força se torne o filme mais visto da história, superando o recorde de Avatar.

Que a Corpore tenha até organizado uma corrida inspirada na série não é mera coincidência. A profecia de Bill Gate se cumpriu: os nerds dominam o mundo, e sua subcultura deixou de ser “sub” para virar o mainstream. Ratos de porão, paperbacks amarelados e jogos truncados de PS1 são coisa do passado.

Mesmo assim, tal como Han Solo, por algum motivo tenho um pressentimento ruim sobre isso.

O charme do caótico

Há algo de especial na “massa embolorada” do universo expandido, em sua qualidade de fanfic e na sua falta de coesão. E não falo das coisas boas que nos foram deixadas. Não há dúvidas de que a Disney se aproveitará do melhor. As especulações sobre o roteiro do Episódio VII estão recheadas de alusões ao universo expandido. De minha parte, basta olhar para Kylo Ren para ver que os artistas conceituais andaram jogando KotOR:

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Antes, o diferencial do universo expandido estava na maneira como era feito, desprovido de centro. Sua “confusão” era fruto de cabeças diferentes colocando no papel visões muito próprias (e conflitantes). Algumas até viravam a franquia de ponta-cabeça, substituindo o binarismo Jedi/Sith por uma reflexão moral de peso, ou explorando um passado realmente muito distante.

Não é de se espantar que a produção tenha sido comparada às fanfics: muitos dos profissionais do império de Lucas – incluindo os compiladores da Complete Encyclopedia – começaram a carreira como fãs.

Um dos casos mais emblemáticos é o de Chad Vader, uma esquete de YouTube protagonizada por um “primo pobre” de Darth Vader que tenta se tornar gerente de um supermercado no Wisconsin. A série faturou o Official Star Wars Fan Film Award em 2007. Não fosse o bastante, George Lucas ficou tão impressionado com a performance de seu criador que ele se tornou dublador “oficial” de Vader no game Star Wars: The Force Unleashed.

Convergência ou divergência?

O cientista da comunicação Henry Jenkins chamou o momento em que vivemos de uma cultura da convergência. Ela seria composta por uma nova geração de consumidores participativos, dispostos a buscar e misturar conteúdo oferecidos em vários meios, e de provedores de conteúdo ansiosos por cativar esse público. Há uma vontade crescente dos fãs de “entrarem” nas franquias que amam e se tornarem, eles também, criadores, e uma apreensão das corporações de perderem o controle sobre suas propriedades intelectuais.

fans bloggers gamersJenkins sem dúvida via a cultura da convergência em Star Wars, tanto é que colocou um cosplayer de stormtrooper na capa de um de seus livros. No entanto,  estaria a convergência com os dias contados?

Antes de tudo, quero dizer que não me identifico com o anti-corporativismo do mundo nerd. Prefiro ser chamado de “drone da EA” a me associar ao tipo de “fã” que faz review-bombing de jogos ou assedia representantes comerciais. E é sempre bom lembrar que a Disney está longe de ser hostil a seu público. Prova: já contrataram o próprio Henry Jenkins como consultor em uma de suas divisões.

Nada é para sempre

O problema é que, historiador que sou, não consigo deixar de pensar que as coisas sempre mudam. E não apenas as roupas que vestimos ou os aparelhos que usamos para escrever, mas também valores, ideias, preferências, identidades. O motivo de orgulho de um sujeito, vinte anos depois, será sua fonte de vergonha. O que nos comove na juventude nos entedia na vida adulta. A grande causa de uma geração é a picuinha da seguinte. Como disse Jolee Bindo, personagem do game Star Wars: KotOR, não pense que a sua guerra é a mais importante só porque você está nela.

Assim, pergunto-me o que será desse “mundo dos nerds” quando a novidade acabar. Quando as mil e uma lojas com “geek” no nome falirem e as empresas pararem de pagar funcionários de cosplay para vender serviços em convenções. Quando os desvairios políticos do momento forem varridos por novas cruzadas,  a nostalgia dos anos 1990 for substituída pela nostalgia dos anos 2010 e os estúdios engavetarem filmes de super herois tal como uma vez já engavetaram os faroestes do John Ford.

Os nerds vão sobreviver. O passado mostrou que eles são uma espécie resistente, adaptava a viver em nichos isolados. É por isso que olhamos para Forry Ackerman e Tove Jansson e vemos paixões em comum, muito embora eles fizessem suas  ‘nerdices’ quando os criadores da subcultura ainda usavam fraldas.

Já o futuro da grande mídia quando o público mainstream migrar para outras paragens é mais incerto. Algumas obras sempre se salvam. Outras, talvez, serão reinventadas décadas depois, como o foram Mad Max e Caça-Fantasmas. No entanto, como as pilhas de VHS mofados em mercados de pulga provam,  a maioria sempre desaparece.

Aqui jaz Ozymandias, rei dos reis...

Aqui jaz Ozymandias, rei dos reis…

A Disney sempre respeitou a sua história, mas é mais fácil respeitar Fantasia do que Infinity War: Parte 2, ou seja lá qual sequel-da-sequel estaremos assistindo daqui há alguns anos.

Sem o dinamismo desse “câncer” de fãs-criadores e seus trabalhos que parecem fanfic, estamos reféns de produtores que vêem no legado de Lucas o ganso dos ovos de ouro – e  que podem, como na fábula, um belo dia decidir por abatê-lo. Sem uma separação canônica entre os seis filmes do “mestre” e os spin-offs, um zumbificação da franquia causará um dano muito maior à imagem da marca. E, com filmes anuais, esta zumbificação já pode ser vista do horizonte.

Pode ser que dê tudo certo. Mas é bom lembrarmos que vivemos em um mundo em que corporações não estão acima de cancelarem gibis e cortarem personagens para que o dinheiro não caia em mãos erradas, nem de sentarem em cima de direitos de exibição, fazendo reboots meia-boca a cada 5 anos para que outros estúdios não lucrem com aquilo.

O mundo corporativo não foi criado ontem, e esses problemas sempre estiveram aí. A diferença é que, com a explosão da onda nerd, nossos hobbies da juventude viraram o cabo-de-guerra da vez. No virar do milênio, experimentamos o lado bom de se tornar popular e “trendy”. Agora começamos a engolir a parte amarga.

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