<\/a><\/p>\n Esse post \u00e9 parte de uma s\u00e9rie. Para ler os artigos anteriores, clique aqui<\/a>. <\/em><\/p>\n Imagem destacada: C\u00e1lice de Ardagh, da cole\u00e7\u00e3o do Museu Nacional da Irlanda<\/a>.\u00a0<\/em>Este artefato medieval foi a inspira\u00e7\u00e3o da ta\u00e7a Sam Maguire<\/a>, entregue atualmente ao vencedor do campeonato s\u00eanior de futebol ga\u00e9lico<\/a> da Irlanda. Foto de Rihani<\/a>.<\/em><\/p>\n Jogos n\u00e3o s\u00e3o feitos apenas de regras, miniaturas impressionantes ou tabuleiros com artes chamativas. Embora existam muitas defini\u00e7\u00f5es do que seja um \u201cgame\u201d \u2013 para Sid Meier<\/a> de Civilization<\/em>, ele seria nada al\u00e9m de uma \u201cs\u00e9rie de decis\u00f5es interessante\u201d \u2013 muitas delas incluem dois pontos fundamentais: meios de se ganhar <\/strong>\u2013 e\/ou, de se perder<\/strong>.<\/p>\n Condi\u00e7\u00f5es de vit\u00f3ria e de derrota podem parecer coisas triviais. Do ponto de vista do design de games, por\u00e9m, elas s\u00e3o tudo menos isso. O desafio \u00e9 dobrado em jogos hist\u00f3ricos, que precisam equilibrar o imperativo de divertir com objetivos que fariam sentido aos povos do passado.<\/p>\n <\/p>\n Como o historiador Robert Houghton<\/a>\u00a0certa vez apontou, \u00e9 justamente a\u00ed que muitos games comerciais pisam na bola.<\/p>\n Todos aqui conhecemos exemplos de jogos que representam com esmero as sociedades de outrora, mas permitem que jogadores ajam como nenhuma personagem hist\u00f3ria se comportaria.<\/p>\n Como eu pr\u00f3pr\u00edo escrevi em outro artigo, muitos jogos de estrat\u00e9gia obedecem \u00e0 f\u00f3rmula 4X <\/em>(ex<\/strong>plorar, ex<\/strong>pandir, ex<\/strong>trair, ex<\/strong>terminar). \u201cGanhar\u201d, nesses jogos, esta intimamente relacionado a crescer. <\/strong>Muitas vezes, por cima de jogadores ou NPCs mais fracos.<\/p>\n <\/p>\n Isso at\u00e9 bate com a ideologia de certos imp\u00e9rios nos s\u00e9culos XIX e XX. Por\u00e9m, n\u00e3o pode de maneira alguma ser tomado como uma regra geral para toda a hist\u00f3ria humana.<\/p>\n O pr\u00f3prio ato de anexar territ\u00f3rio indiscriminadamente, que esses games tratam como natural, dependia de uma imensa log\u00edstica, organiza\u00e7\u00e3o militar e vontade pol\u00edtica que a maioria dos l\u00edderes do passado n\u00e3o tinha \u2013 e sequer tinham a inten\u00e7\u00e3o de ter.<\/p>\n Na \u00e9poca em que se passa Os Triunfos de Tarlac, <\/em>por exemplo (anos 1276 a 1318), reis irlandeses governavam prov\u00edncias min\u00fasculas para os padr\u00f5es contempor\u00e2neos. Thomond, onde se passa o jogo, mal contava com 3,5 mil km2<\/sup>\u00a0 de \u00e1rea territorial (Sergipe, o menor estado brasileiro, possu\u00ed 21,9 mil km2,<\/sup> mais de 6 vezes mais).<\/p>\n Esses governantes contavam com ex\u00e9rcitos compostos de poucas centanas de homens, quando muito. Destes, o grosso vinha das contribui\u00e7\u00f5es de seus vassalos, que podiam simplesmente se voltar contra o pr\u00f3prio rei se ele tomasse decis\u00f5es que os desagradassem. Reinos como esse n\u00e3o tinham condi\u00e7\u00f5es de se envolver em guerras que durassem mais do que alguns meses. Muito menos de expandir indiscriminadamente, absorvendo mais vassalos insubordinados \u2013 e, com eles, ainda mais problemas.<\/p>\n \u201cGovernar\u201d, nesse contexto, era menos uma quest\u00e3o de conquista e supremacia que de achar um equil\u00edbrio entre exig\u00eancias que seus s\u00faditos estavam dispostos a oferecer e os recursos necess\u00e1rios para dissuadir seus rivais \u00e0 rebeli\u00e3o.<\/p>\n Pior: essa modalidade de guerra de baixa intensidade quase nunca chegava a qualquer tipo de conclus\u00e3o. Historicamente, os conflitos entre o Cl\u00e3 Tarlac e Cl\u00e3 Brian Rua pelo dom\u00ednio de Thomond se estenderam mais ou menos de 1260 at\u00e9 1350. Foram quase cem anos de guerra com pouqu\u00edssimas mudan\u00e7as significativas nas fronteiras e balan\u00e7a de poder.<\/p>\n Como vender isso a pessoas acostumadas com jogos que nos permite \u201cpintar o mapa\u201d com nossos imp\u00e9rios?\u00a0 Ou, se n\u00e3o isto, a wargames<\/em>\u00a0em que a vit\u00f3ria ou a derrota estavam vinculadas a uma \u00fanica batalha ou campanha?<\/p>\n <\/p>\n Imagens como essa acima ficaram pendurados (metaforicamente) na minha escrivaninha quando comecei a bolar as regras de Os Triunfos de Tarlac. <\/em>A solu\u00e7\u00e3o, ao meu ver, passava por dois desafios. Primeiro, eu precisaria identificar algum desenlace hist\u00f3rico, dentro do horizonte de espectativa desses reis e magnatas, que pudesse ser chamado de \u201cvit\u00f3ria\u201d. Depois, \u201cgamificar\u201d o percurso at\u00e9 ela para que se tornasse minimamente engajante.<\/p>\n Como nossos testes nos ensinaram da maneira mais dif\u00edcil, nenhuma dessas quest\u00f5es \u00e9 f\u00e1cil de responder.<\/p>\n Se estimular jogadores a guerrearam uns com os outros poderia enviesar o jogo a uma dire\u00e7\u00e3o que n\u00e3o desej\u00e1vamos, por que n\u00e3o premi\u00e1-los ao n\u00e3o <\/strong>fazer isso ?<\/p>\n Essa ideia me levou a pensar num sistema de pontua\u00e7\u00e3o que recompensasse jogadores por a\u00e7\u00f5es historicamente plaus\u00edveis.\u00a0 Chamados de febas<\/em> (em irland\u00eas antigo, \u201cexcel\u00eancia\u201d), esse atributo aumentaria sempre que um jogador fizesse jogadas condizentes a um rei irland\u00eas medieval e diminuiria quando sa\u00edsse dos trilhos.<\/p>\n Nessa linha, vencer batalhas, reduzir a devasta\u00e7\u00e3o de assentamentos sob seu controle, manter-se pr\u00f3spero e honrar compromissos aumentaria a febas<\/em>. J\u00e1 perder batalhas, ter assentamentos destru\u00eddos por outros jogadores e\u00a0sofrer atos de desobedi\u00eancia a diminuiria.<\/p>\n Ao final do jogo, a coaliz\u00e3o de jogadores que tivesse mais febas <\/em>\u2013 somando os pontos de todos os seus integrantes \u2013 seria declarada a vencedora.<\/p>\n Para o jogador que controlasse Thomas de Clare, o magnata ingl\u00eas em Thomond (e que, como um relativo estrangeiro \u00e0 pol\u00edtica irlandesa, n\u00e3o necessariamente jogava pelas mesmas regras),\u00a0 a situa\u00e7\u00e3o seria um pouco mais simples.<\/p>\n Historicamente, os de Clare buscaram assegurar sua posi\u00e7\u00e3o envolvendo-se na guerra entre os U\u00ed Bhriain. Sua presen\u00e7a na regi\u00e3o dependia de opera\u00e7\u00f5es militares regulares e terminou ap\u00f3s uma derrota em batalha<\/a>.\u00a0 Desta maneira, seus objetivos casavam bem com a l\u00f3gica tradicional dos wargames,\u00a0<\/em>e nos permitiu emprestar suas condi\u00e7\u00f5es de vit\u00f3ria.<\/p>\n Para vencer com os irlandeses, portanto, era preciso acumular pontos de\u00a0febas<\/em>. Para vencer com os ingleses, por outro lado, era necess\u00e1rio apoiar uma fac\u00e7\u00e3o irlandesa na guerra e garantir que\u00a0eles<\/strong> terminassem o jogo com\u00a0mais\u00a0febas\u00a0<\/em>que seus inimigos.<\/p>\n1\u00aa Tentativa: Pontos de febas<\/em><\/strong><\/h3>\n